Na mesma edição, em uma sub-retranca da matéria de abertura da reportagem, a Folha de S. Paulo explica as
justificativas para a imunidade tributária da qual são beneficiárias as
igrejas, em texto em seguida transcrito e que também pode ser acessado pelo link abaixo:
Imunidade visa assegurar a liberdade de culto
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
A
lógica por trás da imunidade tributária para igrejas é colocá-las a salvo de
uma da mais formidáveis armas de destruição em massa à disposição do Estado: os
impostos.
Com
efeito, nunca foi muito difícil para governantes inviabilizar as atividades de
seus desafetos apenas aumentando as taxas que incidem sobre o seu negócio. A
imunidade seria assim um reforço econômico ao princípio constitucional que
estabelece a liberdade de culto.
O
raciocínio é irretocável. O único problema é que ele poderia ser aplicado a
todos os ramos de atuação. Por que igrejas devem ser protegidas, mas não o
comércio, a indústria e profissionais liberais em geral?
Como
o poder público não pode dar-se ao luxo de deixar escapar toda a sua base de
arrecadação, o constituinte fez uma opção preferencial pela religião quando a
contemplou com a imunidade. Concedeu a igrejas um benefício que não é nem pode
ser estendido a todos.
Encontram-se
em categoria semelhante partidos políticos, sindicatos, instituições sem fins
lucrativos voltadas à educação e à assistência social e certos produtos
culturais -o papel para impressão de livros, jornais e periódicos é imune a
tributação. São atividades que, ou bem lidam com conteúdos político-ideológicos
sensíveis, ou poupam o Estado de incorrer em gastos sociais, ou ainda têm como
apanágio a livre circulação de ideias.
A
religião, porém, devido a suas particularidades epistemológicas, goza de
autonomia substancialmente maior do que suas congêneres. A lei define de modo
mais ou menos preciso o que é uma instituição filantrópica e quais requisitos
ela precisa cumprir para fazer jus às vantagens fiscais. Já as igrejas, até por
supostamente lidarem com o outro mundo, são refratárias a controle prévio. Que
autoridade terrena pode garantir não ser a vontade de Deus que os fiéis de um
culto consumam chás alucinógenos ou recusem transfusões de sangue?
Na
prática, o único controle que o Estado acaba exercendo é o dos pontos mais
fundamentais do Código Penal. Não se pode criar um culto que envolva
sacrifícios humanos ou que substitua o dízimo por assaltos a banco. Pode-se,
porém, pleitear o direito ritualístico de consumir drogas e, ao contrário de
comerciantes inescrupulosos, não é preciso temer os dispositivos do Código do
Consumidor que punem, por exemplo, a propaganda enganosa.
Muitos
verão aí uma vulnerabilidade do sistema. Pode ser. Mas, aceitando-se o
pressuposto de que a plena liberdade de culto é um valor a preservar, não
existe muita saída.
Aqui,
parece mais razoável ou eliminar qualquer tratamento diferenciado para as
igrejas ou aceitar as consequências dos privilégios a elas concedidos como mais
um dos paradoxos da democracia. (HS)
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