O conteúdo nacionalista da
carta-testamento foi imediatamente incorporado ao programa do PTB, o Partido
Trabalhista Brasileiro. Em nota oficial, divulgada a 25 de agosto, a Comissão
Executiva Nacional e a bancada federal do partido endossaram os “princípios
consubstanciados na última carta do presidente Getúlio Vargas, que são: a)
combate aos abusos do poder econômico; b) defesa do regime de liberdade social;
c) luta pela libertação econômica do povo brasileiro”.
O PSD, o Partido Social Democrático,
colhe os frutos da sua estratégia de manter um certo distanciamento crítico, a
famosa “omissão preventiva”, de um governo do qual fazia parte, mas pelo qual
não se sentia prestigiado, porquanto cortejava a UDN. "Desde o momento em
que teve de partilhar parte do governo com a UDN, o PSD já se sentiu
lesado", declara Tancredo Neves, em depoimento para a História, citado por
Lucia Hippolito no livro “De raposas e reformistas – PSD e a experiência democrática brasileira
(1945-64)”. A própria postura de Getúlio estimulava a
eventual omissão do PSD. Getúlio “jogava na prática com um comportamento
apartidário e de deslegitimização das organizações políticas, advindo
exatamente de seu descrédito nas instituições”, observa Lucia Hippolito no seu
livro. Isso permitiu ao partido preservar seu papel de grande negociador
político, justificando o chiste cunhado por Maria Victoria de Mesquita
Benevides, ao descrever a correlação de forças entre as principais legendas de
então: “A UDN esperneia, o PTB cresce, mas é o PSD que dá o tom.”
O suicídio de Vargas e a sua
carta-testamento marcam profundamente o próprio PCB, o Partido Comunista
Brasileiro. Até então, os comunistas faziam críticas ácidas ao governo de
Getúlio, acusado de se submeter aos interesses dos Estados Unidos e de recorrer
à violência e ao terror contra o povo brasileiro. Na edição de 25 de agosto o
jornal comunista Imprensa Popular
acusou o imperialismo norte-americano de ser o responsável pela morte de
Getúlio e o governo Café Filho de ser formado por “agentes furiosos dos
monopólios de Wall Street”.
O populismo de Getúlio Vargas sobreviveu
ao suicídio do ex-presidente e aparentemente ao seu próprio colapso, cuja evidência
seria o golpe militar de 1964, na interpretação de alguns cientistas políticos, sociólogos e
historiadores. Em versões cada vez mais deterioradas, ele perdura nos tempos
atuais, inclusive sob a forma do populismo obreiro. Ora ele emerge a pretexto da moralidade pública, cobrada naturalmente dos adversários, em rua de mão única; ora desponta no rastro de discursos messiânicos, próprios da prestidigitação política, que utiliza o eleitorado como massa de manobra, coopta mediante o fisiologismo e intimida a oposição mais recalcitrante valendo-se de expedientes torpes, que incluem a utilização nada republicana do aparelho estatal. Mas sempre sob o assistencialismo que fixa o
homem na miséria, ao invés de dela libertá-lo, porque ao mantê-lo refém dos
favores do Estado, faz deste o carcereiro da plena liberdade, para a qual é
condição sine qua non o voto
consciente. Sem o qual perdura o desafio que nos é posto – elites e massas são
duas realidades concomitantes, mas que só se justificam como elites abertas e
massas minimamente conscientes.
Um comentário :
Genial.Acredito que não haverá história de presidente como a dele. Fantástica Biografia.
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