Getúlio Vargas, o Pai dos Pobres: de ditador a presidente eleito. |
“Nada receio. Serenamente dou o primeiro
passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história.”
O que ele próprio previu no arremate da
sua carta-testamento, que é o mais célebre texto atribuído a um presidente do
Brasil, acabou por ocorrer e tornou Getúlio Vargas um personagem
definitivamente incorporado à história sob a aura destinada aos heróis das
massas. Mesmo 60 anos depois de seu suicídio, ocorrido às 8 horas da manhã de
24 de agosto de 1954, com um tiro no coração, na esteira de uma das mais
dramáticas crises político-militar do País, Getúlio Vargas perdura como uma
referência obrigatória, para o bem ou para o mal, sempre que se trata de
algumas das mais vitais transformações pelas quais passou o Brasil. O suicídio,
pela comoção que provocou, acabou por fazer sobrepor, para as massas, a figura
do presidente eleito, que governou de 1951 a 1954, ao ditador que também foi Getúlio,
ao comandar com mãos de ferro, e alta dose de intolerância e truculência, o
Estado Novo, de 1930 a
1945, até ser deposto pelos militares.
De ditador a presidente eleito, Getúlio
percorreu um tortuoso caminho. O Pai dos
Pobres, que patrocinou a legislação trabalhista, com uma série de
conquistas para os assalariados - como a instituição da Carteira Profissional, do salário mínimo e da jornada de trabalho de oito horas diárias, dentre outros benefícios -, foi o mesmo que namorou o nazifascismo, reprimiu violentamente a
oposição e ignominiosamente deportou Olga Benário, mesmo grávida, para a
Alemanha, onde a mulher do líder comunista Luiz Carlos Prestes, preso
juntamente com ela no Brasil, seria remetida a um campo de concentração e assassinada pelos nazistas. As condições sob
as quais Getúlio manteve Prestes na prisão eram tão abjetas que o advogado do líder
comunista, o respeitável Sobral Pinto, invocou a Lei de Proteção aos Animais,
em defesa do seu cliente, a quem defendeu gratuitamente, ainda que dele
discordando visceralmente do ponto de vista político. Deposto, o Pai dos Pobres retornou ao
poder aclamado pelo povo, como presidente eleito, protagonizando um governo
tumultuado, fustigado impiedosamente pela oposição implacável dos setores
conservadores da sociedade brasileira.
A carta-testamento, com o valor que
também tem como peça literária, reforçou a comoção causada pelo suicídio de
Getúlio, revertendo completamente o clima que precedeu o desfecho da tragédia.
Nos 15 dias anteriores ao seu suicídio, ele foi impiedosamente criticado pela
imprensa. A população, forças políticas e as Forças Armadas exigiam sua
renúncia. O que certamente explica a passagem do documento na qual Getúlio
denuncia o linchamento político do qual era vítima. “Mais uma vez as forças e
os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre
mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam; e não me dão o direito
de defesa”, desabafa, na sua despedida.
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