quarta-feira, 29 de outubro de 2014

ANÁLISE – O uso da máquina e o poder econômico

        Levanto a hipótese de que o uso da máquina, em articulação com o poder econômico, fez a diferença no dia da eleição”, declara Roberto Corrêa, ao ser indagado sobre as causas do desfecho da eleição para o governo do Pará, com a vitória do governador Simão Jatene (PSDB), reeleito, sobre Helder Barbalho (PMDB). “Na minha apreciação, não houve falha no desempenho de Helder, tanto no programa eleitoral gratuito como nos debates. Helder mostrou segurança e seu desempenho foi positivo”, sublinhou Corrêa, em entrevista ao Blog do Barata, que segue abaixo.

        A derrota de Helder Barbalho, o candidato ao governo do Pará pelo PMDB, representa o fim do ciclo do seu pai e patrono político, o senador e ex-governador Jader Barbalho, hoje com 70 anos e que perpetuou seu nome como a mais longeva liderança política da história do Pará?

        Não vejo apenas pelo ângulo da longevidade política de Jáder Barbalho, algo importante para a dominância regional peemedebista, mas e principalmente pelos efeitos diretos dessa longevidade, em associação com as qualidades performáticas de Helder Barbalho que, em resposta a uma eleição polarizada, teve sua liderança reconhecida e demonstrada, como bem atesta a enorme votação conquistada tanto no primeiro como no segundo turno destas, que foram as eleições mais concorridas da história recente da política paraense. Enfrentando a máquina estatal e seus derivativos de uma agressiva escuderia midiática, Helder conseguiu totalizar 1,721 milhão de votos, anunciando com isso o surgimento de uma inconteste liderança, pronta a assumir e ocupar o cenário político paraense nas próximas décadas.

        Como é praxe em políticos de perfil solar, Jader Barbalho jamais admitiu sombras no PMDB, partido que no Pará se confunde com o seu nome, inibindo a emergência de lideranças com luz própria. Helder Barbalho teria tempo para ganhar vida própria e habilitar-se a comandar o PMDB, sem estar a reboque do pai e patrono, como ocorreu até aqui?

        Tendo a ver esse aspecto particular da luminosidade política do líder maior, como algo comum a todas as agremiações partidárias fortes. Partidos fortes como PMDB, PSDB e PT, em razão da busca por maximização de voto, tendem a se tornar parecidos naquilo que chamamos de coalizão de líderes. Seja Jader Barbalho e Temer, no PMDB; Serra, FHC e Alkmin, no PSDB ; ou Lula, no PT. A luminosidade dessas lideranças não as tornam de uma hora para outra caudilhos partidários, mas homens necessários para a busca do consenso nas disputas internas – aquilo que os ingleses chamam de desavenças no “Jardim Secreto”. A verdade é que tais lideranças, para avançarem nas decisões intra e interpartidárias, necessárias indispensáveis às vitórias eleitorais, terão sempre de contar com o apoio de lideranças territorialmente dispersas, sobretudo aquelas que no exercício de mandatos de representação (deputados e senadores) ou em funções executivas (prefeitos), usufruam de ativos de poder. Jader Barbalho, se é líder inconteste no PMDB, é porque trabalhou sempre com essa orientação estratégica. Por outro lado, é da capacidade de articulação de Jader que Helder Barbalho aparece como projeto viável de sua sucessão no PMDB. Algo que decorre não apenas do prestígio do pai, mas, e muito, em função das habilidades de Helder em fazer-se respeitar pela capacidade política de articulação. Ou seja: Helder Barbalho é ele e suas circunstâncias, que incluem a história do pai, Jader Barbalho, e da mãe, deputada federal Elcione Barbalho.

        Para além da escandalosa utilização da máquina administrativa estadual pelo governador tucano Simão Jatene, Helder Barbalho foi vítima do caráter plebiscitário que acaba ganhando qualquer eleição majoritária na qual se envolva, direta ou indiretamente, Jader Barbalho?

        Eleições plebiscitárias são inevitáveis em decorrência do avanço da democracia, em ambiente institucional ainda dominado pelo uso abusivo da máquina pública. No Para esse padrão de campanha ficou muito evidente no segundo turno quando, na base do tudo ou nada, a maquina pública escolheu os bairros pobres de Belém e os municípios pobres do Marajó para reverter as tendências de voto que no primeiro turno eram francamente favoráveis a Helder Barbalho. A figura de Jader Barbalho, mesmo não sendo candidato, foi utilizada na campanha para desorientação do eleitor, que se apresentava utilizados para enfraquecer essa tendência no segundo turno.

        Até onde o estigma de quinta-essência da corrupção, que aderiu de forma aparentemente indelével a Jader Barbalho, conspirou contra Helder Barbalho, nesta eleição para o governo do Pará? Ou faltou ao candidato peemedebista uma biografia política mais alentada, mais consistente, de forma a não ser tomado como um mero preposto do pai e patrono político?

        Acredito que os ataques a Jáder Barbalho, como patrono da candidatura Helder, tenham sido usados com essa intenção, mas a principal causa da vitória de Jatene no segundo turno tem a ver mais com as ações deliberadas do poder econômico. Prova disso é que no primeiro turno Helder Barbalho teve mais votos que Jatene, em que pese a propaganda contra Jader ter sido utilizada na mesma intensidade.

        O marketing eleitoral de Helder Barbalho foi, aparentemente, perfeito, ao manter na defensiva o adversário, mais preocupado em responder às denúncias de malfeitos feitas no horário político do candidato peemedebista, que pessoalmente deteve-se em um discurso propositivo, embora cobrando promessas não cumpridas por Simão Jatene. No que Helder Barbalho falhou, ou Simão Jatene soube melhor explorar, para reverter um cenário profundamente adverso e acabar reeleito, em apenas 21 dias?

        Na minha apreciação, não houve falha no desempenho de Helder, tanto no programa eleitoral gratuito como nos debates. Helder mostrou segurança e seu desempenho foi positivo. Levanto a hipótese de que o uso da máquina, em articulação com o poder econômico, fez a diferença no dia da eleição.

        Simão Jatene ganha um terceiro mandato como governador com o Pará politicamente dividido quase meio a meio, com adversários que chegam ao fim da campanha como um pote até aqui de mágoas. Sob esse cenário, o que se pode esperar do novo mandato de Simão Jatene, considerando que, para o bem ou para o mal, a política no Pará passa, necessariamente, por Jader Barbalho?

        Os desdobramentos dessa cena de partida ainda encontram-se influenciados pelas mágoas da campanha. Há que esperar o surgimento de novas composições que haverão de surgir tanto em nível nacional como local. No entanto, uma coisa é certa: Jatene tem dificuldade de descentralizar o comando do governo e, com isso, terá dificuldade de favorecer o surgimento de uma liderança capaz disputar o próximo governo. Nomes como o de Zenaldo Coutinho e de Manoel Pioneiro podem aparecer sem que tenham necessariamente substantivo apoio de Simão Jatene. O PMDB, no entanto, tem esse nome que deverá continuar avançando nas preferências do eleitorado. O nome de Helder Barbalho.

        E no plano nacional, como deve se comportar o governo Dilma Rousseff, considerando que o senador Aécio Neves sai da disputa eleitoral cacifado por uma expressiva votação e uma minguada diferença em relação a candidata petista, com o mérito adicional de ter resgatado a importância histórica de Fernando Henrique Cardoso, como o presidente da estabilidade econômica, que tornou possível Lula ter sido o presidente da inclusão social?


        Não resta dúvida de que Aécio Neves é e será o grande nome do PSDB nas próximas eleições. Dilma e o PT deverão buscar uma nova imagem de governo, e para tanto haverá de enfrentar desafios normais a um partido como o PT, hoje desacreditado em suas postulações morais. Os escândalos de corrupção do passado recente serão, a um só tempo, objeto de desgaste do governo e objeto de argumentação em defesa do plebiscito que busque uma reforma política capaz de reorientar o quadro institucional brasileiro em direção a uma democracia moderna, que tenha como princípio básico o fortalecimento dos partidos e a redução da corrupção. Sem reforma política, nada muda. Disso sabem a situação e a oposição.

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