SEDES – O caos institucionalizado

LÚCIA *

Mais uma vez o noticiário nacional expõe nossas mazelas e não temos muito a dizer em nossa defesa. Quero expor porém, alguns dos motivos que nos deixam num patamar vergonhoso quando se trata de trabalho infantil. O SBT mostrou, recentemente, como triste exemplo, a cidade de Benevides, com a imagem do lixão local repleta de crianças catando imundícies, alguns, acompanhados de seus pais. Todos beneficiários do bolsa família. O programa do governo federal, que nunca foi bem administrado por boa parte dos gestores municipais e ultimamente (de três anos para cá) não tem recebido o devido monitoramento do governo do Estado, o que é sua obrigação conforme determina o Ministério do Desenvolvimento Social. Os gestores municipais preocupam-se em saber apenas se a renda das famílias estão dentro dos parâmetros para que possam receber o beneficio. Mas, como seria o certo, deixam de verificar se os filhos estão trabalhando, ou não, se estão na escola ou em situação de outros riscos sociais, são principais condições para estarem recebendo o Bolsa Família.
Ocorre que o Governo Federal unificou os Programas. Desde essa integração - Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e o Programa Bolsa-Família (PBF)),que começou em 2006 -, a falta de entendimento vem trazendo prejuízos às crianças e adolescentes. A própria família não entende a nova dinâmica do beneficio. Outro grande nó, é o Programa de Convivência Familiar e Comunitária, que deveria caminhar junto com os demais e existir em todos os municípios. Pois bem, os gestores não conseguem por em pratica suas diretrizes, que seriam vitais para o sucesso do PBF. Soma-se a esse caos, a ausência da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social do Pará, que tem se “focado muito” em pouquíssimos municípios, deixando outros à mingua, no completo abandono. Inúmeras vezes os técnicos da SEDES alertaram sobre a gravidade da situação nos municípios mais próximos da capital. mas o alerta nunca foi levado em consideração.A diretoria de assistenca social sofre de síndrome da auto suficiência, não permite ouvir a experiência dos técnicos e, por outro lado, uma parte considerável dos “entendidos” do Estado e dos municípios. Os prefeitos nunca priorizam o combate ao trabalho infantil, alguns acham isso até natural, pois não conseguem atravessar a fronteira da nossa historia, impregnada de preconceitos e do fatalismo. Mas isso é uma outra questão.
O grave mesmo nesse contexto, é a posição (ou a falta dessa) da SEDES. O monitoramento e a capacitação que os técnicos deveriam fazer, esbarram no excesso de teoricismo da SEDES/DAS. Resultado: o abandono dos municípios não é figura de retórica, é real.
Os Centros de Referencia de Assistência social, os CRAS, que deveriam funcionar com os Programas fortalecidos, são considerados por especialistas como o carro-chefe do combate ao trabalho infantil. Ações como atividades esportivas, culturais e de reforço escolar no turno contrário ao da escola, deveriam funcionar diariamente, como uma forma de manter a criança ocupada e longe da exploração. Mas são poucos os municípios que conseguem êxito, e quando ocorre, é por pura determinação da equipe técnica do CRAS, que muitas vezes é mal remunerada e quando consegue emprego melhor, vai embora.
O CRAS ou CREAS têm sido palco de brigas políticas para saber quem indica quem. A competência pouco importa. O cargo que não deveria ser de confiança, mas sim de competência, pela via do concurso público, causa a constante mudança do profissional. Isso tem ocorrido em algumas regiões como o Marajó, por exemplo. Brigas entre prefeitos e gestores estaduais são uma constante e motivo de atrasos nas ações assistenciais.
Um outro problema sério para o MDS, e para a propria SEDES, é a falta de estrutura dos municípios. Boa parte deles não tem telefone, internet, luz elétrica de qualidade e espaços físicos dentro dos padrões exigidos. Acessar o site do MDS é uma aventura e algumas vezes um milagre. Perde-se prazos e a paciência; o tal Navega Pará é uma fantasia e nunca chegou onde deveria ter chegado; as estradas e os perigos das embarcações são barreiras constantes. Como alcançar todos os municípios, seja presencialmente ou de modo virtual, tem sido o entrave dos profissionais. Por outro lado, a realidade do Norte é um caso que muitas vezes o ministério não consegue entender. Isso, somado aos passos de tartaruga da SEDES, mais especificamente da DAS, nos expõe a isso que foi noticiado pelo SBT. Os técnicos ficam arrasados, com uma sensação que estão lutando sozinhos por uma causa perdida. A diretoria de assistência da SEDES exibe uma certa obtusidade e uma certa arrogância em tratar o assunto conjuntamente com eles. Para completar, o fórum estadual de erradicação do trabalho infantil - que tem a participação do DIEESE, DA SEDUC, da DRT do MP e outros, além da propria SEDES -, foi duramente criticado e desconsiderado pela referida DAS. Isso desmotivou e desarticulou o Fórum. Que, se antes já funcionava sem apoio, muitas vezes foi disperso por relapso de todo, inclusive da SEDES. Porém, quem é cobrado pelo MDS é a SEDES, quem leva “bronca” do Fórum Nacional é a SEDES e não os demais órgãos do governo. Pior, quem vai ate Brasília para levar essa bronca é a equipe técnica que, como já disse, não é ouvida pela DAS, na esmagadora maioria das vezes. Ao contrario, desconsiderados e destratados na frente dos colegas, ao exporem suas preocupações, alguns técnicos desistem de lutar contra a maré. Existem os privilegiados e os que ficam invisíveis. Quem perde com isso? A infância dos meninos pobres desse Estado.
Diante desse cenário, é de espantar que a imprensa nacional ainda não tivesse exposto mais essa mazela paraense. Como diz a minha mãe, não adianta colocar uma cortina bonita para encobrir a bagunça da casa. Bate um vento, e por uma brecha dá para ver toda a bagunça.

* Lúcia é uma colabora assídua deste blog, que opta por se manter no anonimato.