terça-feira, 12 de janeiro de 2010

ELEIÇÕES – Américo Canto e o poder da credibilidade

“Fazer pesquisa não é simplesmente conhecer fórmulas de amostragem como alguns acreditam. O desenvolvimento da pesquisa requer cientificidade e critérios para seu desenvolvimento. Critérios estes que envolvem todo um conjunto de técnicas que devem ser respeitadas.” Essa advertência é de Américo Canto (foto), 47, diretor do Instituto Acertar, de Belém, notabilizado pela margem de acerto de suas pesquisas de intenção de voto, inclusive aquelas cuja divulgação foi eventualmente vetada pela Justiça Eleitoral, conforme ilustra matéria no site da empresa (www.acertarcoop.com.br/). Discreto senhor de grandes segredos, Canto é formado em sociologia pela UFPA, a Universidade Federal do Pará, e há mais de uma década se dedica a pesquisas de opinião pública. Ele, porém, se recusa a conferir às pesquisas de intenção de voto o poder de manipulação que frequentemente lhes é atribuído. “Não podemos afirmar que a pesquisa exerce tanta influência no voto do eleitor, que a pesquisa faz o eleitor mudar seu voto, votar naquele que vai ganhar, etc.”, assinala, na entrevista concedida ao Blog do Barata, na qual, diplomaticamente, contornou opiniões mais ácidas, que sua vasta experiência, certamente, lhe permitiriam externar.

Com a autoridade de quem se dedica há mais de uma década a pesquisas de opinião pública, o senhor já advertiu publicamente, mais de uma vez, sobre a distorção que representa se conferir maior relevância às pesquisas de intenção de voto, em detrimento até do cotejo das propostas dos candidatos. O senhor poderia explicitar mais didaticamente essa sua crítica e apontar os eventuais antídotos capazes de neutralizar essa distorção?

Na realidade, a pesquisa eleitoral é uma ferramenta de suma importância em uma campanha eleitoral. A mesma, quando bem elaborada, reúne, ou melhor, sistematiza as opiniões da sociedade e aponta seus anseios, dentre outros que podem ser utilizados pelo marketing político eleitoral. Entretanto, até que ponto as pesquisas influenciam no voto do eleitor? Essa é uma questão não levantada por mim, mas por aqueles que são estudiosos do assunto, como, por exemplo, Alberto Carlos Almeida, dentre as quais se incluem Como são fitas as pesquisas eleitorais e de opinião e A cabeça do eleitor. Como diretor do Instituto de Pesquisas Acertar, preocupo-me com o assunto, com o jogo de números, o que acaba levando as empresas de pesquisa ao descrédito.
É de conhecimento público que a guerra dos números apresentados nos meios de comunicação geram vários conflitos na sociedade. Surgem dúvidas quanto à veracidade dos dados divulgados. As pesquisas estão certas ou erradas? Dá para confiar nelas? Elas favorecem a quem? Enfim, surgem vários questionamentos da sociedade sobre as pesquisas e isso reflete também nos políticos e empresas de pesquisas.
Se pararmos para observar o comportamento dos principais atores envolvidos quando da divulgação dos resultados das pesquisas eleitorais, percebemos que cada um deles tem uma forma diferente de tratar as informações e é esse um dos fatores que contribuem para o conjunto de dúvidas e desconfianças sobre os resultados das pesquisas eleitorais.
O ator político tem como objetivo principal vencer a eleição, portanto, as pesquisas que lhe interessam são aquelas que o colocam em primeiro lugar. Dificilmente o candidato, o cabo eleitoral, o coordenador de campanha aceita um resultado de pesquisa que aponte seu candidato em situação desfavorável, daí a tendência em tentar impugnar a divulgação dos resultados, via Tribunal Regional Eleitoral, ecoando o descrédito pelos veículos de comunicação e colocando em dúvida os resultados apresentados. Em suma, tentar confundir o eleitor. Mesmo que a pesquisa esteja correta, acaba caindo em descrédito pela atitude daqueles que estão mal colocados segundo os resultados apresentados.
Por outro lado os jornalistas trabalham com a notícia, precisam registrar mudanças, dificilmente observam os resultados tendo como base a margem de erro da pesquisa. O importante é a manchete, o crescimento ou decrescimento, nos índices de intenção de votos dos candidatos. Isso é fácil de ser comprovado se pegarmos os jornais de anos eleitorais e observarmos as manchetes conjuntamente com as matérias divulgadas.
E um terceiro ator é o coordenador de pesquisa. Se ele é sério, quer ter precisão científica, é isso que garante sua credibilidade, sua permanência no mercado. Por isso o mesmo pretende que a leitura dos dados seja feita de forma científica.
A visão dispare desses três atores confunde os eleitores e os levam ao descrédito. É claro que também existem as situações duvidosas de resultados forjados, dentre outros, mas esses casos convêm deixarmos com a justiça eleitoral.
Com certa freqüência ouvimos pessoas falarem assim: “Fulano só ganhou as eleições por causa da última pesquisa veiculada nos meios de comunicação”.
Não podemos afirmar que a pesquisa exerce tanta influência no voto do eleitor, que a pesquisa faz o eleitor mudar seu voto, votar naquele que vai ganhar, etc.
Existem suposições que as pesquisas influenciam o eleitor indeciso, mas isso não se dá em todos os casos, indistintamente.
Cabe, a propósito, citar Alberto Carlos Almeida: “O que se sabe é que existe a influência indireta: Se dá no processo de campanha (hipótese comprovada). Um resultado negativo para um candidato pode vir a fazer com que os correligionários, os financiadores, os militantes fiquem desanimados e a campanha poderá esvaziar, etc....”

Em anos eleitorais, como 2010, voltam à agenda pública as suspeitas de manipulação das pesquisas de intenção de voto, para favorecer este ou aquele candidato. É possível, tecnicamente, blindar essas pesquisas contra as tentativas de manipulações, ou pelo menos identificar os indícios de tentativas de manipulação?

O Tribunal Superior Eleitoral recentemente divulgou a resolução 23.130 que trata sobre o registro de pesquisas eleitorais e os critérios e solicitações da lei devem ser respeitados. Até a eleição passada um dos itens da lei apontava que as empresas que pretendiam divulgar pesquisas deveriam estar devidamente registradas junto aos Conselhos Regionais de Estatística - CONRE, assim como, a pesquisa deveria ser assinada por um estatístico. O inovador na resolução atual é a não obrigatoriedade da empresa em ter o registro do CONRE, embora tenha sido mantida a exigência da assinatura do estatístico. Meu questionamento está na seguinte questão: quem avalia se os critérios solicitados pela resolução estão sendo respeitados? As coligações? Nada contra o trabalho dos advogados, mais acredito que quem melhor pode avaliar a veracidade das informações seria o estatístico, seria algum representante do Conselho de Estatística. São eles que entendem de amostragem e ponderação. Não podemos afirmar que isso blindaria a divulgação de pesquisas, como você chamou, manipulada, mas penso que as empresas estariam mais protegidas, o profissional de estatística respeitado e, portanto, menos vulnerável ao jogo de interesse dos grupos políticos concorrentes.

Segundo a versão corrente, um dos álibis para disfarçar as tentativas de manipulação das pesquisas de intenção de voto seria ir aproximando os números fictícios das porcentagens mais próximas da realidade, de acordo com o calendário eleitoral. Essa versão é verossímil? Esse truque existe, ou pelo menos existem indícios capazes de alimentar as suspeitas sobre a sua ocorrência?

Realmente, não sei se existe esse truque. Não acredito que uma empresa de pesquisa manipule todo um processo eleitoral. Os erros nos resultados da pesquisa, quando comparados com os resultados oficiais, também estão relacionados ao número de pessoas indecisas e é no decorrer das campanhas que os eleitores vão decidindo em quem votar. Muitas vezes o eleitor deixa para tomar decisão na última hora.

Diante desse tipo de suspeita, que presumivelmente arranha a credibilidade das pesquisas de intenção de voto, não soa paradoxal a presunção de que, a despeito disso, essas pesquisas sejam capazes de induzir o eleitor a votar nesse ou naquele candidato?

Sua pergunta confirma minha resposta anterior. Não dá para acreditar que as pesquisas detenham todo esse poder de induzir a massa popular em votar neste ou naquele candidato. É fantasioso delegar tanto poder as pesquisas e subestimar a capacidade de interpretação da população.

Uma realidade com a qual nos defrontamos no Pará - um Estado que hoje exibe índices sociais africanos, o que sugere a proliferação de grotões eleitorais e a sobrevivência do voto de cabresto - favorece a tentativa de manipulação do eleitorado?

Eu não tenho dúvida disso. Vitor Nunes Leal, em seu livro Coronelismo, enxada e voto, nos remete a uma profunda reflexão do controle que o coronel detinha sobre aqueles que trabalhavam em suas terras. Hoje, a terminologia mudou, em lugar do coronel temos o “doutor”, que está sempre cercado de técnicos e assessores ávidos por eleger seus candidatos e, diante de uma população desprovida de seus direitos, acontece a troca de favores. Aquilo que é obrigação do poder público passa a ser moeda de troca nas campanhas eleitorais, um aterro aqui, um asfalto acolá e assim por diante.

Como o senhor avalia a terceirização da realização das pesquisas de intenção de voto, tal qual fez o Ibope nas eleições municipais de Belém em 2008, pontuadas por suspeitas de manipulação das pesquisas de intenção de voto?

O problema me parece que não está na terceirização e não posso afirmar que houve manipulação. É comum as empresas de pesquisas de atuação nacional contratarem fornecedores locais para desenvolver seus projetos regionais. Quero acreditar que deve haver por parte das empresas contratadas o controle de qualidade da pesquisa, tipo a verificação, a checagem de pelo menos 30% do material coletado em campo.

O que pode explicar o fenômeno que representou a reeleição do prefeito de Belém, Duciomar Costa (PTB), com o agravante de dispor de maioria na Câmara dos Vereadores, apesar da impopularidade sinalizada pelas pesquisas de avaliação sobre o seu primeiro mandato, anteriores ao pleito municipal de 2008?

A eleição do prefeito Duciomar Costa é um acontecimento que vai de encontro ao que alguns cientistas políticos afirmam. “Um candidato com alto índice de rejeição dificilmente ganha em uma reeleição”, rezam os postulados consagrados. Mas isso ocorreu no Pará. Os adversários não foram suficientemente hábeis e o anseio pela rua pavimentada falou mais alto. Esse é um dos exemplos de como funciona a moeda de troca eleitoral.

O simples fato dela dispor da chave do cofre e da caneta que nomeia e demite justifica se atribuir a priori, à governadora Ana Júlia Carepa, o status de uma das candidatas favoritas na sucessão estadual de 2010, apesar das avaliações negativas sobre seu mandato?

Prefiro falar com base em estudos empíricos. Não dispomos de resultados atualizados sobre a corrida eleitoral no Pará, mais acho que vai depender muito das alianças que se formarem em torno dos candidatos, apesar da probabilidade de vitória da atual governadora.

O Instituto Acertar, que se confunde com o seu nome, se notabilizou pela margem de acerto de suas pesquisas de intenção de voto, inclusive aquelas cuja veiculação foi vetada pela Justiça Eleitoral. O que pavimenta essa margem de acerto, que confere a inquestionável credibilidade do Instituto Acertar?

Fazer pesquisa não é simplesmente conhecer fórmulas de amostragem como alguns acreditam. O desenvolvimento da pesquisa requer cientificidade e critérios para seu desenvolvimento. Critérios estes que envolvem todo um conjunto de técnicas que devem ser respeitadas. São esses critérios que procuramos seguir à risca quando do desenvolvimento das pesquisas que fazemos. Isso nos garante boa margem de acerto nas pesquisas, principalmente, aquelas realizadas já bem próximas das eleições. Mais é importante deixar claro que existem situações que fogem ao nosso controle e uma dessas situações é quando estamos trabalhando com uma sociedade que demonstra alto índice de indecisão ou que, por medo de alguma represália, prefere não declarar seu voto. Isso acontece principalmente nos municípios de médio e pequeno porte, onde o maior empregador é o município, a prefeitura.

4 comentários :

Anônimo disse...

O Américo é um batalhador. No final da década de 80 quando a pesquisa quanti era vista com certo desprezo por nossos intelectuais de plantão e, principalmente por políticos sem voto, o Américo já tentava demonstrar a importância das verificações para orientar a tomada de decisões.
Um grande abraço Américo Canto. Valeu Barata pela Entrevista.
Roberto Louchard

Anônimo disse...

Caro Barata,
Gostei muito da entrevista, e posso garantir que o Instituto Acertar dirigido pelo Sociólogo Américano Canto, de fato vêem fazendo a diferença em questão de pesquisas eleitorais, no Estado do Pará, desde a década de 80. Acredito que a seriedade e competência de todos que fazem O ACERTAR poderá neste ano eleitoral, contribuir efetivamente
com a sociedade paraense no sentido, de esclarecer as tendências da disputa, nas análises de conjuntura politica,nas informações através dos diversos meios de comunicações para a ampliação da cidadania e decisão do voto consciente.Concordo com o amigo Roberto Louchard: o Américo é um Batalhador. Dário Azevedo.

Duddu Kahwage disse...

Caro Américo
Como faço para marcar uma conversa com você?
Sou o Duddu Kahwage, acadêmico do curso de ciências sociais com ênfase em ciência política da Esamaz.
Queria ver a possibilidade de estarmos promovendo uma palestra com esse tema: Ele~ções 2010. Meu email é dudukahwage@yahoo.com.br

Abraços!!!


Barata, obrigado pelo espaço, e parabéns pelo blog.

Anônimo disse...

Gostei muito dessa entrevista. Parabéns Américo Canto!

Vladimir Araujo
Diretor do Veritate