Na tentativa de vender suas falácias, Jair
Bolsonaro recorre a sofismas toscos e ofende a inteligência dos eleitores.
Assim, por exemplo, foi ao falar sobre:
A mamata do auxílio-moradia
O presidenciável Jair Bolsonaro e um dos
seus filhos, Eduardo Bolsonaro, ambos deputados federais, recebem dos cofres
públicos R$ 6.167 mensais de auxílio-moradia, mesmo tendo um imóvel em
Brasília, segundo revelou – sem ser desmentida - a “Folha de S. Paulo”, em 2 de janeiro deste ano. O
apartamento de dois quartos (69 metros quadrados), em nome de Jair, foi
comprado no fim dos anos 90, quando ele já recebia o benefício público, mas
ficou pronto no início de 2000.
O capitão recebe da Câmara dos Deputados o
auxílio-moradia desde outubro de 1995, ininterruptamente. Eduardo, seu filho,
desde fevereiro de 2015, quando tomou posse em seu primeiro mandato como
deputado federal. Ao todo, pai e filho embolsaram até dezembro de 2017 R$ 730
mil, já descontado o Imposto de Renda.
Além do apartamento em Brasília, os
políticos da família Bolsonaro tem mais 12 imóveis no Rio de Janeiro, a maior
parte adquirida nos últimos 10 anos, acrescentou a reportagem dos jornalistas
Camila Mattoso e Ranier Bragon, da “Folha de S. Paulo”.
Questionado sobre a mamata, na sabatina da
GloboNews, alegou que valeu-se da lei, ignorando a escandalosa transgressão
ética. “Fui tão desonesto como você”, revidou, alegando que o jornalista Gerson
Camarotti, como a maioria dos seus colegas, ganhava como pessoa jurídica para
driblar o Imposto de Renda. Ao evocar o deslize ético imposto hoje pela maioria
dos grupos de comunicação aos seus jornalistas, recorreu ao ardil de quem alega precedentes para
justificar seus tropeços na matéria.
Racismo do pai e ameaças do filho
Jair Bolsonaro (à dir.) com o filho, Eduardo. |
A
Procuradoria-Geral da República (PGR) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal
(STF), a 13 de abril deste ano, duas denúncias contra os deputados federais Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro, por
motivos diferentes. O deputado federal Jair Bolsonaro foi denunciado por
racismo praticado contra quilombolas, indígenas, refugiados, mulheres e LGBTs.
Seu filho, o também deputado Eduardo Bolsonaro, foi denunciado por ameaçar de
morte a jornalista Patrícia Lélis.
Durante
palestra no Clube Hebraica do Rio de Janeiro, em abril do ano passado,
amplamente divulgado na internet e na imprensa, Jair Bolsonaro usou expressões
de cunho discriminatório, incitando o ódio e atingindo diretamente vários
grupos sociais. De acordo com a PGR, o deputado faz um paralelo da
formação de sua família para destilar preconceito contra as mulheres: “Eu tenho
cinco filhos. Foram quatro homens, a quinta eu dei uma fraquejada e veio uma
mulher”. Em seguida, Bolsonaro apontou seu discurso de ódio para os índios,
impondo-lhes a culpa pela não construção de três hidrelétricas em Roraima e
criticando as demarcações de terras indígenas. O ataque a variados grupos
sociais continuou mirando os quilombolas. Segundo o parlamentar, essas
comunidades tradicionais “não fazem nada” e “nem para procriador eles servem
mais”.
Já o filho de Jair Bolsonaro, Eduardo
Bolsonaro, também deputado federal como o pai, por meio do aplicativo Telegram enviou várias mensagens à
jornalista Patrícia de Oliveira Souza Lélis dizendo que iria acabar com a vida
dela e que ela iria se arrepender de ter nascido. Questionado se o diálogo se
trataria de uma ameaça, respondeu: “Entenda como quiser”. O parlamentar
escreveu ainda diversas palavras de baixo calão com o intuito de macular a
imagem da companheira de partido: “otária”, “abusada”, “vai para o inferno”,
“puta” e “vagabunda”. A discussão ocorreu depois que Eduardo Bolsonaro postou
no Facebook que estaria namorando Patrícia Lélis, que nega a relação. Além
de prints das conversas que comprovam a ameaça, a vítima
prestou depoimento relatando o crime.
O estopim do imbróglio
entre o deputado e a jornalista foi Eduardo publicar em seu perfil no Facebook
um desabafo a respeito de uma ex-namorada que, nas palavras dele, trocou roupas
recatadas por danças sensuais, depois de ter rompido com ele para sair com um
médico cubano. “Feminismo é uma doença”, escreveu o deputado. Mesmo sem ser citada
nominalmente, Patrícia respondeu nas redes sociais que viveu uma relação
afetiva abusiva com o deputado por três anos. Isso fez Eduardo Bolsonaro
desfechar uma saraivada de insultos e ameaças a Patrícia Lélis no Telegram,
aplicativo concorrente do Whatsapp que tem entre suas principais ferramentas
uma que permite a destruição automática das mensagens conforme período
pré-estabelecido. Embora
Eduardo tenha acionado o dispositivo para que o texto desaparecesse após cinco
segundos, Patrícia conseguiu gravar o diálogo e entregar uma cópia à polícia.
Ditadura militar
Passeata dos 100 mil , no Rio, em 1968, antes do AI-5, início dos chamados anos de chumbo. |
Ao recalcitrar em reconhecer como ditadura
o regime militar, que se estendeu de 1964 a 1985, ele argumenta com uma
atipicidade, que foi o rodízio de ditadores, um ponto fora da curva do padrão
habitual dos regimes totalitários. O que não exime a constatação histórica
sobre o caráter de regime de exceção que é próprio das ditaduras.
Todos os generais-presidentes foram eleitos
pelo Congresso, argumenta ainda o capitão, na sua insana tentativa de negar a
existência da ditadura militar. Convenientemente, ele omite que tratava-se um
Congresso tutelado, do qual foram expurgadas sucessivas lideranças da oposição
e ao qual cabia referendar os nomes ungidos nos conciliábulos castrenses.
Conivência com a censura
Capa da "Veja" sobre o AI-5: edição censurada. |
Sobre a liberdade de imprensa,
suprimida pela ditadura militar, que impôs uma draconiana censura,
particularmente após o AI-5, em 1968, Bolsonaro ofende a inteligência, ao
alegar que foi no regime de exceção que surgiram a TV Globo, em 1965, e a
revista “Veja”, em 1968. Ao tentar minimizar a ação deletéria da censura, escamoteia
que a TV Globo prosperou incensando a ditadura militar e silencia sobre a implacável
censura que logo se abateu sobre a “Veja”. “Os censores da ditadura militar brasileira pareciam saber que
seu trabalho era ilegítimo. Esforçavam-se por impedir que o público tomasse
conhecimento das restrições impostas à imprensa. Em vários episódios de censura
a ‘Veja’, a partir de 1968 e por boa parte da década de 70, a revista tentou
evidenciar que sofrera cortes, deixando trechos em branco no meio da página ou
substituindo as partes cortadas por esdrúxulas figuras de diabinhos. As
autoridades baixavam normas coibindo esses expedientes. Os embates entre
censores e jornalistas estão documentados em ‘Veja sob Censura – 1968-1976’
(Jaboticaba; 352 páginas; 42 reais), da jornalista e historiadora Maria
Fernanda Lopes Almeida”, relata ojornalista Reinaldo Azevedo.
A
propósito dos tempos sombrios da censura, Reinaldo Azevedo prossegue: ”O
episódio mais emblemático da censura a ‘Veja’ se deu em dezembro de 1968, logo
depois da promulgação do AI-5. O censor ficou satisfeito em saber que a revista
dedicada ao tema não teria título na capa. A imagem, porém, era eloquente: o
presidente Costa e Silva aparecia sentado, sozinho, no Congresso que mandara
fechar. O Exército determinou que a revista fosse recolhida das bancas. ‘Veja’ sofreu
censura prévia – com um censor lendo tudo o que seria publicado – com mais
rigor entre 1974 e 1976. Antes disso, o governo ditava listas de temas que não
poderiam ser abordados”, acrescenta ainda Reinaldo Azevedo.
A eleição de Tancredo no colégio eleitoral
Da esq. para a dir: Sarney, Marco Maciel, Tancredo e ACM: adesão da dissidência do regime militar. |
Ao pretender justificar as eleições
indiretas para presidente, impostas pela ditadura militar, Bolsonaro argumenta
que o ex-presidente Tancredo Neves, cuja eleição é o marco da redemocratização
do Brasil, foi eleito no colégio eleitoral. “Que ditadura é essa que permite
eleição?”, debocha em seu simplismo cínico. Omite que Tancredo foi ao colégio
eleitoral comprometido com o restabelecimento das eleições diretas, em
candidatura viabilizada pela decomposição da ditadura militar, o que permitiu a
adesão de quadros do regime militar à Aliança Democrática, como José Sarney e
Antônio Carlos Magalhães, que fizeram carreira sob o regime dos generais. “Vamos
ao colégio eleitoral para destruí-lo, não para coonestá-lo”, proclamou
Tancredo, na época, ao explicitar a estratégia das oposições democráticas após
o fracasso das Diretas-Já, o maior movimento de massas da história brasileira,
em defesa das eleições diretas para presidente. A emenda Dante Oliveira,
instituindo as eleições diretas para presidente, foi barrada pelo Congresso,
dominado pela maioria parlamentar que dava sustentação ao regime militar. Nesse
contexto, o nome de Tancredo Neves emerge em contraposição à candidatura de
Paulo Maluf, que tinha o apoio do governo do último general-presidente, João
Baptista Figueiredo.
Marcado pela transição política, iniciada
pelo ex-presidente Ernesto Geisel e que incluiu a Lei da Anistia e o fim do
bipartidarismo imposto pela ditadura militar, o governo Figueiredo acabou
estigmatizado pela crise econômica em vários setores da economia, fraco desempenho
do PIB (produto Interno Bruto), que gerou recessão, e aumento da inflação, cuja
média chegou, entre 1983 e 1985, a 200% ao ano. As greves reivindicando
melhores salários, principalmente na região do Grande ABC, foram reprimidas com
violência pelo governo.
Com a morte de Tancredo Neves,
hospitalizado na véspera da posse e que acabou falecendo na esteira das
complicações de uma cirurgia de diverticulite, assumiu seu vice, José Sarney,
um político que servira a ditadura e que com ela rompera em seus estertores.
Por tê-lo como traidor, o general Figueiredo recusou-se a passar-lhe a faixa.
Ao deixar o poder, o último general-presidente teve seu desejo, expresso
semanas antes de deixar o poder, prontamente atendido pelo povo brasileiro: “Quero
que me esqueçam.”
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