Juíza Kátia Parente Sena: respeito à independência funcional do MP. |
Tão ou mais deletéria que a mentira é a
meia verdade, porque obscurece os fatos, a pretexto de esclarecê-lo. Pela Constituição Federal, nas ações de
improbidade administrativa o governador não tem privilégio de foro, podendo ser
julgado em primeira instância e por juízo singular, mas cabe somente ao
procurador-geral de Justiça processá-lo, ou por autoridade com delegação para
tanto, o que de resto determina a Lei Orgânica do MP. Profissionais de competência, probidade e experiência reconhecidas, o procurador de Justiça Nelson Medrado e o promotor de Justiça Armando Brasil
obviamente não desconhecem a lei, tanto quanto, no íntimo, sempre souberam das
amarras que tornaram o procurador-geral de Justiça, agora em fim de gestão,
refém do governador tucano Simão Jatene. Ao longo de sua administração,
pontuada por recorrentes suspeitas de improbidade administrativa e denúncias de
patrimonialismo, Marcos Antônio Ferreira das Neves portou-se como um boy
qualificado do governador Simão Jatene. A despeito disso, sempre foi poupado de
críticas por Medrado, cujo prestígio o tornou o grande avalista eleitoral de
Neves, tanto na eleição, como na reeleição. Por carecer da credibilidade de
Medrado, Neves tratou de prestigiá-lo na chefia do Núcleo de Combate à Improbidade
Administrativa, cujas ações, por sua repercussão na mídia, sempre
serviram para lustrar a imagem do MPE e aplacar as críticas à atual
administração. Na ilação de muitos, no MPE, Medrado tomou como manifestação de
amizade e reconhecimento o caráter utilitário que teve para Neves, servindo de
marketing para consumo externo.
Aparentemente,
diante da notória subserviência de Neves ao Palácio dos Despachos, Medrado e
Brasil optaram por uma manobra temerária. Não por acaso, pateticamente pretenderam,
no curso da ação, que a juíza Kátia Parente Sena intimasse Neves a se
manifestar sobre a delegação de autoridade para que ajuizassem a ação civil
pública, por improbidade administrativa, contra o governador, a secretária
estadual de Administração e o filho do governador. Ou seja, pretenderam transferir para a magistrada uma obrigação que era deles, única e prioritariamente deles, na esteira da qual poderiam ter recorrido à corregedoria, ao conselho de procuradores, ou até ao CNMP, o Conselho Nacional do Ministério Público, forçando o procurador-geral a se manifestar, cumprindo um dever de ofício. “Verifica-se, também, que o
Ministério Público quer que este Juízo intime o procurador-geral de Justiça
para que este se manifeste sobre o ato delegatório para a propositura da
presente ação em face do governador do Estado do Pará”, observa a magistrada,
nos autos, em um contexto que sugere incredulidade face ao inusitado da solicitação. A juíza Kátia Parente Sena previsivelmente descartou a pretensão de
Medrado e Brasil. Após citar os parágrafos 1º e 2º do artigo 127 da
Constituição Federal, a magistrada conclui: “Portanto, a Constituição Federal,
a legislação federal e estadual conferem a autonomia e independência funcional
ao Ministério Público no sentido de tomar decisões relativas a atividade-fim,
sem injunções de outros órgãos do Estado.” Por esse vício de origem, a
ação civil pública ajuizada não prosperou e a juíza Kátia Parente Sena fez o
que lhe competia fazer.
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