YACOFF
SARKOVAS *
A pior
previsão se confirmou. Os candidatos com maior índice de rejeição e que
representam os extremos de um país dividido e cheio de rancor estão no segundo
turno. Os eleitores que preferiam o meio termo ficaram no meio do caminho.
Agora,
são exatamente esses brasileiros que terão a inglória missão de definir quem
(des)governará o país nos próximos anos. De um lado, um candidato tosco, pouco
qualificado, defensor da ditadura militar e da tortura, misógino, sexista,
racista, xenófobo e populista. De outro, o bom moço que se submeteu a ser
preposto de um criminoso detido e a encenar e propagar as mentiras oficiais de
seu partido, corrupto e incompetente, que produziu uma crise ética e econômica
sem precedentes.
É fácil
apontar razões para não votar em Bolsonaro. Difícil é encontrar motivos para
optar por Haddad. Seu programa de governo reedita o modelo econômico
nacional-desenvolvimentista de Geisel e Dilma, que empobreceu e retardou o
Brasil; subestima a gravidade do déficit fiscal que impossibilita o investimento
publico, gera risco de explosão inflacionária e inibe o investimento privado;
não reconhece os graves crimes que seu partido cometeu ao montar o maior
esquema de corrupção de um país cuja expertise na matéria se constrói desde os
tempos coloniais.
O PT
tenta nos convencer de que não votar em Haddad põe em risco nossa democracia.
Mas não explica por que não aplica os mesmos preceitos à Venezuela e Cuba,
entre outras ditaduras que apoia. Nem porque afronta nossas instituições,
tachando de golpe um processo de cassação que seguiu todas as normas e ritos
legais, para demover uma senhora destrambelhada que cometeu crimes fiscais em
série, desestabilizando a economia, destruindo empregos e penalizando
diretamente os mais pobres.
Ou
porque busca rotular a Lava Jato como um complô contra seu partido e seu líder,
e não como um processo histórico contra o patrimonialismo, clientelismo e a
corrupção, pilares da ineficiência e ineficácia da máquina pública brasileira.
Os que
não votaram em Bolsonaro devem se perguntar com humildade por que quase 50
milhões de brasileiros, representando quase 50% dos votos válidos do primeiro
turno, escolheram alguém como ele.
Da minha
parte, entendo que o PSDB, por seu currículo de omissões, e o PT, por seu
prontuário de ações, são os grandes responsáveis. Os tucanos flexibilizaram
seus ideais a cada eleição, diluindo sua identidade até não significar mais
nada. Os petistas afrontaram a ética e a aritmética, corrompendo sua moral e
corroendo nossa economia.
Se
Haddad quer o voto das pessoas de bom senso alijadas das eleições, não basta
atiçá-las com o horror que Bolsonaro representa. É preciso que exorcize o
horror que o PT representou e pode ainda representar. Para isso, o partido
deveria reconhecer publicamente seus descaminhos éticos, abdicar da sua visão
econômica anacrônica, não nos ameaçar com mecanismos manipuláveis de
“democracia direta” e, principalmente, passar a respeitar todos os brasileiros,
deixando de dividi-los entre “nós contra eles”.
Essa
estratégia é oportunista e perversa. Ela instrumentaliza nossa iniquidade
social, desqualificando inúmeros segmentos que trabalham duro, pagam impostos e
querem um país menos desigual, mas são tachados como “inimigos dos pobres” para
compor uma narrativa de conquista e manutenção de poder.
Caso
Haddad não abandone o desgastado script lulopetista —e acredito que
dissimulará, mas não o fará— entendo que nós, que não somos responsáveis
diretos por essas opções desafortunadas do segundo turno, temos o direito em
não optar por nenhum dos dois candidatos e, simplesmente, votar em branco.
Por
conta do meu círculo de relações, não recebo apelos para escolher Bolsonaro.
Jamais o faria. Candidato menos dissimulado, entendo que ele é tão ruim quanto
parece. Também não acredito na sua súbita e inconsistente adesão ao liberalismo
econômico, único ponto que poderia dele me aproximar.
Por
outro lado, sou bombardeado por defensores da civilização me afirmando que é
Haddad ou a barbárie. Mas eles não abordam o custo, os riscos e as mentiras
dessa opção. Leio essas mensagens como mais uma demonstração da notável
capacidade do PT de instrumentalizar pessoas e movimentos positivos da nossa
sociedade, como o #EleNão.
Ninguém
precisa carregar peso na consciência por votar em candidatos dos quais
discorda, pelo que são e/ou representam. Com todos os seus defeitos e
fragilidades, a democracia e as instituições brasileiras aguentarão o tranco de
mais quatro anos de inevitável descaminho. Nossa aprendizagem é, infelizmente,
muito custosa.
Quem não
se sente representado por Bolsonaro ou Haddad pode se sentir livre para votar
em branco como opção política.
No
primeiro turno, votar em branco não era necessário, porque havia candidatos
para todos os gostos, nem inteligente, pois diminuiria o número de votos
válidos e aumentaria a chance do mais votado ultrapassar 50% e liquidar a
fatura.
Nada
disso ocorre no segundo turno, quando o eleitor deve ter a clareza de que tem
três opções: um candidato, o outro candidato e nenhum candidato. Qualquer
escolha é uma manifestação de cidadania, igualmente.
No atual
contexto, penso que até faria bem ao Brasil que abstenções, nulos e brancos
fossem substanciais, para comprovar o ocaso do projeto de poder do PT e
sinalizar para Bolsonaro que sua ascensão é, como foi a de Collor, uma
aberração circunstancial.
* Yacoff
Sarkovas é fundador e CEO na Sarkovas Consultoria. Artigo publicado na “Folha de
S. Paulo” e acessado pelo link https://www1.folha.uol.com.br/ poder/2018/10/o-direito-de- nao-aceitar-nenhum-dos-dois. shtml?utm_source=facebook&utm_ medium=social&utm_campaign= compfb&fbclid= IwAR1GLjVuIAnQLUD_ My87TWNhZSrS433cmyG0lHJSXeL6kL P7mlSd2dfVR6k
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