Em seguida a transcrição, na íntegra, da
coluna de Elio Gaspari deste domingo, 12, que também pode ser acessada pelo
link logo abaixo:
Começou
o terceiro mandato da doutora
12/04/2015 02h00
O primeiro mandato da doutora Dilma foi de
2011 a dezembro de 2014. O segundo durou 97 dias. Teve vida mais curta que o de
Napoleão entre sua fuga da ilha de Elba e a batalha de Waterloo. O terceiro
começou na semana passada. Nada tem a ver com o que a candidata prometeu ou com
o que tentou fazer. Para um governo que se meteu em tantas trapalhadas em tão
pouco tempo qualquer previsão será um exercício astrológico. De qualquer
maneira, ninguém de boa-fé poderá dizer que Guido Mantega seria melhor ministro
do que Joaquim Levy. Da mesma forma, trocar o aloprado "núcleo duro"
de Aloizio Mercadante por Michel Temer indica que terminou o período de
articulação do caos.
Temer teve a astúcia de assumir uma função
sem ocupar qualquer cargo. Um bom indicador para a sua fé no trato com a
doutora será a leitura de sua agenda. No dia em que for anunciado que, por
alguma razão, ele viajou para o exterior, estará dado o sinal de que desistiu.
O comissário Tarso Genro queixou-se dizendo
que "para o bem e para o mal: PT é cada vez mais acessório no
governo". Qual PT? O da Papuda e de João Vaccari ou o de Sérgio Buarque de
Holanda e Florestan Fernandes? A referência a fundadores mortos deve-se à falta
de exemplos seguros entre os vivos que estão sem bússola.
Para o bem, a perda de influência do PT
significa estancar a produção de maluquices a que ele se entregou. Coisas como
plebiscitos, Constituinte exclusiva, voto de lista ou mesmo a convocação do
"exército" de João Pedro Stedile (com quentinha ou sem quentinha?).
O breve segundo mandato da doutora
fritou-se. O terceiro, socorrido por Temer, exigirá dela tocar o expediente,
valendo-se do apoio de seus aliados. Essas duas funções não podem ser
terceirizadas, são atribuições da Presidência da República. Se o novo mandato
tiver menos marquetagem e mais trabalho, quem sabe, dará certo.
-
ANAC ÀS MOSCAS
A doutora Dilma entregou a coordenação
política do governo a Michel Temer. Pelo andar da carruagem precisará arrumar
um coordenador de governo. É difícil, mas alguém pode achar que oito meses é um
prazo aceitável para a escolha de um ministro do Supremo.
Na Agência Nacional de Aviação Civil a
situação é pior. A Anac tem cinco diretorias. Três estão vagas. A primeira
delas desde 2013, quando o titular foi defenestrado no rastro de um escândalo.
A terceira vagou há três semanas. Estão brincando com fogo. Em 12 anos o setor
passou a 34 milhões de passageiros/ano para 101 milhões em 2014. É o terceiro
do mundo, perdendo só para os EUA e a China, e as tarifas caíram 40%.
A alta do dólar e a retração da economia
podem roubar uma das joias da coroa do PT, devolvendo o andar de baixo para as
rodoviárias.
PORTA GIRATÓRIA
O senador Ataides Oliveira (PSDB-TO) quer
uma CPI para investigar os ilícitos cometidos no Conselho de Administração de
Recursos Fiscais. A ideia poderá expandir o tema. Se recuar muito, arrisca-se
chegar ao século 16, quando os caetés comeram o provedor Antonio Cardoso de
Barros, o primeiro secretário da Receita de Pindorama. A porta giratória que
transformava auditores aposentados em consultores de empresas autuadas que
recorriam ao Carf para reduzir seus débitos, foi lubrificada no início da
década de 90. Desde então rodou invicta, até que chegou a Polícia Federal.
PAVIO CURTO
Ao lidar com a repercussão de suas falas
desastradas, o ministro Joaquim Levy já deu uma demonstração de que anda com
pavio curto.
FRANCES PERKINS
O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa,
contou que acaba de ler uma biografia de Frances Perkins, a mulher fenomenal a
quem Franklin Roosevelt entregou a Secretaria do Trabalho em 1933.
Barbosa deveria distribuir uma tradução
desse livro ("The Woman Behind the New Deal" - "A mulher por
trás do New Deal") aos comissários que lidam com os chamados
"movimentos sociais" para que conhecessem uma pessoa de quem poucos
terão ouvido falar.
Tendo sido uma das personagens mais
poderosas de Washington ao longo dos 12 anos em que Roosevelt ocupou a
Presidência, ao sair do governo teve que batalhar por empregos de segunda.
Pegara fama de esquerdista e sempre vivera do salário. Nem endereço tinha.
Arrumou-se com um quarto na Universidade Cornell. Morreu em 1965, aos 85 anos,
cega e surda, em heroica pobreza.
Ela ajudou a criar a Previdência Social
americana, a proteção aos desempregados, o salário mínimo e as leis que
proibiram o trabalho infantil. Quase todo o crédito foi para Roosevelt e, o que
sobrou, para sua mulher Eleanor. Isso nunca a incomodou, pois tinha horror a
jornalistas.
Perkins batia duro. No dia em que assumiu o
cargo, seu antecessor, fazendo-se de desentendido, disse que sairia para
almoçar. Ela mandou que suas coisas fossem tiradas do escritório e mandadas
para casa. Começou a trabalhar espantando a barata que estava numa gaveta e foi
adiante expulsando ratos bípedes.
Frances Perkins não tinha agenda pessoal.
Duas coisas a moviam: a fé na religião e a vontade de trabalhar pelo andar de
baixo.
-
O SOFTWARE VENCIDO DAS EMPREITEIRAS
As bancas de defesa dos empreiteiros
capturados pela Lava Jato continuam tentando usar nesse processo o software
usado com êxito na Operação Castelo de Areia. Algo como tentar rodar um
programa AppleWorks no sistema OS 10 do Macintosh. Em 2009 a Polícia Federal
chegou a um ninho de roubalheiras provadas e documentadas. Seu trabalho foi
desossado pelos advogados dos maganos a partir de objeções processuais e há
pouco o Supremo Tribunal Federal sepultou-o.
O último sonho da turma que está presa em
Curitiba foi o de obter do STF a anulação dos depoimentos de Alberto Youssef em
sua colaboração com a Viúva. Morreu numa decisão do ministro Dias Toffoli.
Amparada num parecer do ex-ministro do STJ Gilson Dipp, a defesa argumentava
que Youssef não merecia crédito porque já fechara dois acordos de colaboração e
mentira em ambos. Se esse raciocínio prevalecesse, quebraria uma perna da Lava
Jato.
Dipp entende do assunto, mas a ideia de que
velhas mentiras devessem impedir um novo acordo é meio girafa.
O mafioso Tommaso Buscetta, preso no Brasil
em 1972, foi extraditado para a Itália, fez um acordo com o juiz Giovanni
Falcone (flor do orquidário de Sergio Moro) e expôs boa parte das ações da
Máfia. Ajudou bastante, mas também mentiu e recusou-se a falar de políticos.
Em 1992 a Máfia dinamitou o carro do juiz
Falcone, matando-o. Buscetta começou uma nova rodada de colaboração e nela
entregou as conexões da Máfia com políticos, inclusive o ex-primeiro ministro
Giulio Andreotti. Graças a essa nova fase detonou o coração da Máfia com o
poder.
Pela doutrina de Dipp, as provas
apresentadas por ele depois da morte de Falcone seriam
"imprestáveis", pois as omitira na primeira colaboração.
Nenhum comentário :
Postar um comentário