terça-feira, 2 de agosto de 2016

ELEIÇÕES – Drama do eleitor


Um comentário :

Anônimo disse...

A politização do noticiário e da justiça criou o fenômeno conhecido da duplalinguagem. Há uma realidade de fato, mas que não pode ser descrita nas narrativas públicas, por pudor, modéstia e para não explicitar o fracasso do modelo democrático brasileiro.

Como no realismo latino-americano, há um cadáver no meio da sala, mas toda a família conversa normalmente, como se o morto ainda vivesse. De acordo com nossa tradição beletrista, não existem fatos que uma boa retórica não possa retocar. A retórica é o photoshop dos fatos.

A Lava Jato atua como um poder imperial. Montou alianças com a mídia e com partidos, logrou conquistar a opinião pública e ganhou todo o espaço possível para exercitar seus poderes. Isto é fato.

Procuradores e o juiz Sérgio Moro fazem questão de testar periodicamente os limites desse poder. Substituíram o modelo anterior, a profusão de recursos dos quais se prevaleciam os grandes escritórios de advocacia, por um poder autocrático, no qual são abolidos princípios fundamentais de direito.

Mas obviamente não podem admitir que se tornaram poder imperial.

Toca, então, a se valer de recursos de retórica para explicar que o que estão fazendo não é bem aquilo que todos sabem que estão de fato fazendo. Como, por exemplo, manter suspeitos em prisão temporária pelo tempo que for necessário, até que sejam convencidos a aderir às delações premiadas.

Tome-se o caso do casal João Santana. Nove meses de prisão temporária. Bastou se curvar às imposições e aderir à delação premiada que a Lava Jato quer – não é qualquer delação – para imediatamente ser solto.

Há uma relação óbvia de causa e efeito, não? Segundo a Lava Jato, não.

Segundo a matéria do Estadão, “o advogado explicou que as solturas não têm relação com os depoimentos de delação premiada dos dois, mas com o fato de o juiz ter entendido que não há mais razões para manter a prisão preventiva, uma vez que estão colaborando”. E aí dos clientes, se o advogado ousar interpretação menos digna para a soltura.

Pelas redes sociais, bravos procuradores se esmeram em divulgar estatísticas mostrando que a maior parte das delações foi feita com os delatores em liberdade. Logo, não haveria coação.

Faça 50 prisioneiros. Fuzile os 10 primeiros que se recusaram a colaborar. As colaborações dos restantes serão espontâneas? Pela nova linguagem brasileira, absolutamente espontâneas.

Então, fica combinado o seguinte: a Lava Jato ganhou o poder de prender quem quiser do lado de lá; de poupar os do lado de cá. Por méritos próprios pode prender quem quiser, incluir nas delações os nomes de quem ousar criticá-la, processar os recalcitrantes.

Mas que se assumam como vitoriosos. Não precisam mais esse cuidado de informar aos poucos que a democracia brasileira subiu no telhado. Todos sabem que já despencou.
(GGN)