quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

MPE – A ação contra André Ricardo Otoni Vieira

        Segue abaixo a transcrição, na íntegra, da ação ajuizada contra André Ricardo Otoni Vieira, o sócio, advogado e amigo-de-fé-irmão-camarada do procurador-geral de Justiça, Marcos Antônio Ferreira das Neves, por este nomeado assessor do MPE, o Ministério Público do Estado do Pará:

EXCELENTÍSSIMO SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA 4ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE BELÉM/PARÁ
(DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA AO PROCESSO 0064529-46.2014.8.14.0301)


PRIORIDADE DE TRAMITAÇÃO

(art. 1º, VIII, do Provimento 12/2008 – CMB/TJPA)

 
 





O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, por intermédio de seus Promotores de Justiça abaixo assinados, no uso de suas atribuições legais e com base no art. 129, inciso III, da CF/88, demais dispositivos que o regulamentam e de acordo com a Lei 8.429 de 02/06/92, vem diante de Vossa Excelência propor a presente
AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA C/C PEDIDO CAUTELAR DE AFASTAMENTO DO CARGO
em desfavor de:
ANDRÉ RICARDO OTONI VIEIRA, brasileiro, casado, servidor público, engenheiro civil e advogado, inscrito no CPF sob o nº. 259.268.102-72 e na OAB/PA sob o nº. 14.116, portador do  RG nº. 5208703-PC/PA, com domicílio necessário[1] no Ministério Público do Estado do Pará, Edifício Sede, Rua João Diogo, nº. 100, Cidade Velha, CEP 66.015.160 Belém/PA, lotado no Gabinete do Procurador Geral de Justiça, onde deve receber os atos de comunicação decorrentes deste processo judicial;
pelas razões de fato e de direito que passa a expor:

1.     DOS FATOS
Em 17 de abril de 2013, ANDRÉ RICARDO OTONI VIEIRA foi nomeado para ocupar o cargo de provimento em comissão de Assessor do Procurador Geral de Justiça (MP.CPCP-102.6), no Ministério Público do Estado do Pará, conforme consta na portaria de nomeação de fls.18 e 46 , assinada pelo Procurador Geral de Justiça MARCOS ANTÔNIO FERREIRA DAS NEVES.
Cumprindo as formalidades para a referida nomeação, o requerido declarou não participar da gerência ou administração de empresas privadas, de sociedade civil ou de comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário, nos termos do que dispõe o art. 178, VII e IX, da lei estadual 5.810/94/94 (Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos do Estado do Pará), consoante declaração de fls.138.
Passados 01 (um) ano e 07 (sete) meses no pleno exercício do cargo para o qual foi nomeado, foi descoberto e publicado no “Blog do Barata”, que o demandado era sócio gerente e administrador das empresas que mantém em sociedade juntamente com o Procurador Geral de Justiça MARCOS ANTÔNIO FERREIRA DAS NEVES.
Foi descoberto, ainda, que o requerido, advogado, com inscrição na OAB/PA sob o nº. 14.116, exerce a advocacia com regularidade tendo como ilustre cliente o próprio Procurador Geral de Justiça do Pará – Marcos Antônio Ferreira das Neves –, conforme se depreende das diversas petições e atos processuais juntados nas fls. 146 a 180, 192 a 197 e 199, muito embora esta atividade seja vedada aos servidores do Ministério Público, por incompatível com o serviço prestado a este Órgão Ministerial.
Ademais, o requerido exercia a advocacia no horário do expediente institucional, conforme restará demonstrado nos autos, tendo em vista a comprovação documental de uma diligência externa realizada em um dia que o ponto eletrônico demonstrava entrada no Ministério Público às 06:58 da manhã e saída às 17:09 da tarde (fls. 223).
Esses fatos foram noticiados ao então Procurador Geral de Justiça interino, Dr. Manuel Santino do Nascimento Junior, que, então, exonerou o servidor ex officio, conforme publicado na edição do diário oficial do dia 18 de novembro de 2014.
Foram ainda determinadas outras providências, dentre as quais a delegação de atribuições para a Procuradora de Justiça  ANA TEREZA DO SOCORRO DA SILVA ABUCATER, que ajuizou ação de improbidade administrativa contra o Procurador Geral de Justiça, autuada sob o nº. 0064529-46.2014.8.14.0301; bem como a remessa de cópias do Processo Disciplinar Preliminar nº. 042/2014-MP/CGMP, para apuração por parte desta Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa da conduta do servidor ANDRÉ RICARDO OTONI VIEIRA, que teria praticado atos incompatíveis com o cargo comissionado de assessor de Procurador-Geral de Justiça, o que foi feito com o tombamento do Inquérito Civil 000285-151/2014, que, após instruído, culminou na propositura da presente ação.
Cumpre informar, contudo, que, no dia 10 de dezembro de 2014, ao retornar ao cargo de Procurador Geral de Justiça, ao término de sua licença[2], MARCOS ANTÔNIO FERREIRA DAS NEVES nomeou novamente ANDRÉ RICARDO OTONI VIEIRA para o mesmo cargo comissionado, como comprova o Diário Oficial nº. 32.785, de 10/12/2014, em anexo às fls. 198.
Este o relatório dos fatos a serem apurados.

2.     MATÉRIA PRELIMINAR. DA DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA DO PROCESSO À 4ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA DE BELÉM
Excelência, antes de adentrar no mérito da demanda, é necessário destacar, preliminarmente, uma questão relevante para o deslinde e regular processamento desta ação de improbidade administrativa.
Trata-se da necessária distribuição por dependência desta presente demanda ao juízo da 4ª Vara de Fazenda Pública de Belém. E isto se dá em virtude de haver uma ação de improbidade ajuizada nesta vara, registrada sob o número 0064529-46.2014.8.14.0301, que trata de matéria conexa a desta presente ação, mas que figura o Dr. MARCOS ANTÔNIO FERREIRA DAS NEVES, Procurador Geral de Justiça, no polo passivo.
Neste ínterim, aponta-se que nos termos do art. 103, do CPC, existe conexão entre as causas porque lhes é comum a causa de pedir, a saber a contratação/ingresso irregular de um indivíduo no serviço público e as condutas irregulares posteriores ao ingresso no cargo.
Não fossem estes argumentos suficientes, destaca-se o art. 17, §5º, da lei 8.429/92, que rege a ação de improbidade administrativa:
Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

(...)

§ 5o  A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto. 

Portanto, seja com base na legislação ordinária, seja com base na legislação própria, existe fundamento para a reunião das ações.
Destaca-se, ainda, como fundamento para tanto, o princípio da economia processual e a preocupação em evitar-se decisões contraditórias em casos semelhantes.
Requer-se, portanto, haja a distribuição por dependência ao processo 0064529-46.2014.8.14.0301, em trâmite na 4ª Vara de Fazenda de Belém, pelos fundamentos acima expostos.

3.               DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS PARA CONDENAÇÃO POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

3.1.          DA VIOLAÇÃO À MORALIDADE ADMINISTRATIVA. DA ATUAÇÃO NA ASSESSORIA DA CHEFIA MESMO ENQUANTO SÓCIO GERENTE E ADMINISTRADOR DE SOCIEDADE EMPRESÁRIA.
Excelência, importa destacar, na espécie, que o Sr. ANDRÉ RICARDO OTONI VIEIRA procedeu de forma dolosa à violação de princípios-base regentes da Administração Pública, sobretudo os princípios da moralidade, legalidade e da impessoalidade, incorrendo, portanto, na prática de atos de improbidade administrativa previstos no art. 11, caput e inciso I, da Lei nº. 8.429/92.
Restou comprovado que o demandado exercia a função de sócio gerente e administrador em uma sociedade empresarial (Rota 391 Comércio Varejista de Combustíveis Automotores e Serviços Ltda.), que mantém junto com o Dr. Marcos Antônio Ferreira das Neves, Procurador Geral de Justiça, que o nomeou para cargo em comissão no Ministério Público do Estado do Pará.
Além disso, o requerido ocupava este posto de gerente e administrador em diversas outras empresas (fls.104 e 105).
Ao menos no que diz respeito à empresa ROTA 391 COMÉRCIO VAREJISTA DE COMBUSTÍVEIS AUTOMOTORES E SERVIÇOS LTDA, é possível observar que mesmo em 2014 a empresa está ativa, de acordo com o que dispõem as certidões obtidas junto à JUCEPA às fls. 52 e 53.
Ressalte-se que, no ato de sua nomeação, o requerido declarou, falsamente, não participar da gerência ou administração de empresas privadas, de sociedade civil ou de comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário, nos termos do que dispõe o art. 178, VII e IX, da Lei Estadual nº. 5.810/94/94 (Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos do Estado do Pará), consoante declaração de fls.138.
Evidencia-se, nesse ponto, a conduta do requerido em violação expressa ao que determina o Regime Jurídico Único, consoante dispõe os dispositivos abaixo transcritos constantes na declaração por ele assinada:
Art. 178 - É vedado ao servidor:
(...)
VII - participar de gerência ou administração de empresa privada, de sociedade civil, ou exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário;
(...)
IX - participar da gerência ou administração de associação ou sociedade subvencionada pelo Estado, exceto entidades comunitárias e associação profissional ou sindicato;

Observe-se que esta vedação não traz qualquer exceção, mitigação, ressalva ou atenuante. Trata-se de vedação peremptória e inafastável.
Não subsiste qualquer defesa no sentido de que seria possível a atuação do servidor como gerente ou administrador enquanto a empresa ainda não estivesse totalmente em funcionamento. Os atos de gerência e administração já podem ser vislumbrados desde o momento inicial da formação da empresa, com a solicitação de licenças, alvarás, integralização de capital social, assim como sendo tomadas medidas para alocação da sede da empresa, entre outras necessárias para sua efetivação.
Em adição, reputa-se necessário destacar que no caso concreto não existe a possibilidade de aplicação dos ditames da Medida Provisória 2.174-28, de 24 de agosto de 2011, levantada como argumento em defesa dos atos mercantis praticados irregularmente pelo requerido. Alegou-se em sua defesa que esta MP teria relativizado a vedação prevista no Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos, ao permitir que aqueles que estivessem submetidos a jornada de trabalho reduzida poderiam participar de gestão de sociedades mercantis ou civis.
O referido diploma com força de lei institui, no âmbito do Poder Executivo da União, o Programa de Desligamento Voluntário – PDV, a jornada de trabalho reduzida com remuneração proporcional e a licença sem remuneração com pagamento de incentivo em pecúnia, destinados ao servidor da administração pública direta, autárquica e fundacional.
Observa-se, portanto, patentemente e inicialmente, que em relação ao âmbito de aplicabilidade da Medida Provisória, ela não poderia ser estendida aos servidores do serviço público estadual, porquanto instituída para o âmbito do Poder Executivo da União.
Ademais, traz-se à colação o relevante art. 5º, da referida Medida Provisória, que expressamente condiciona sua aplicação exclusiva para ocupantes de cargos de provimento efetivo  e veda sua aplicação a servidores ocupantes de cargo submetido à dedicação exclusiva, senão vejamos:
Art. 5o.  É facultado ao servidor da administração pública direta, autárquica e fundacional, ocupante exclusivamente de cargo de provimento efetivo, requerer a redução da jornada de trabalho de oito horas diárias e quarenta semanais para seis ou quatro horas diárias e trinta ou vinte horas semanais, respectivamente, com remuneração proporcional, calculada sobre a totalidade da remuneração.

§ 1o.  O disposto no caput deste artigo não se aplica aos ocupantes de cargo de provimento efetivo das carreiras ou dos cargos de que tratam os incisos I a III e V e VI do caput do art. 3o.

§ 2o  Observado o interesse da administração, a jornada reduzida com remuneração proporcional poderá ser concedida a critério da autoridade máxima do órgão ou da entidade a que se vincula o servidor, vedada a delegação de competência.

§ 3o  A jornada reduzida poderá ser revertida em integral, a qualquer tempo, de ofício ou a pedido do servidor, de acordo com o juízo de conveniência e oportunidade da administração, ressalvado, em qualquer hipótese, o disposto no parágrafo único do art. 16.

§ 4o  O ato de concessão deverá conter, além dos dados funcionais do servidor, a data do início da redução da jornada, mediante publicação em boletim interno.

§ 5º. O servidor que requerer a jornada de trabalho reduzida deverá permanecer submetido à jornada a que esteja sujeito até a data de início fixada no ato de concessão.

Art. 6o. Além do disposto no §1o do art. 5o, é vedada a concessão de jornada de trabalho reduzida com remuneração proporcional ao servidor:
I - sujeito à duração de trabalho estabelecida em leis especiais; ou
II - ocupante de cargo efetivo submetido à dedicação exclusiva.
(...)

Cumpre ressaltar, portanto, que da leitura deste dispositivo é possível extrair-se as seguintes conclusões. Primeiramente, a jornada de trabalho reduzida deve ser requerida pelo servidor e que é faculdade de Administração Pública concedê-la, não havendo qualquer registro disto nos autos funcionais do requerido. Em segundo lugar, a MP é bastante clara: é instituto restrito aos servidores ocupantes de cargo efetivo, o que não se vislumbra no caso em análise, haja vista que o requerido é ocupante de cargo comissionado.
Por óbvio, não bastassem estas duas conclusões acima expostas –  as quais já seriam suficientes para expor a ilegalidade cometida pelo requerido, que exerce atividades gerenciais e administrativas ao alvedrio da vedação legal –, é imperioso deixar bem claro que o Sr. André Ricardo Otoni Vieira trabalha (ao menos em tese) trabalha em regime estendido, pela própria natureza de seu cargo de assessoramento da Administração Superior.
Conforme se observa das fls.183 , está registrado textualmente que “(...) André, conforme se pode verificar pelo seu ponto eletrônico, durante todo o tempo que ocupou o cargo público, não faltou, sequer, um dia de forma injustificada, além de diariamente começar sua jornada de trabalho antes das sete horas, muitas vezes ficando além desse horário.”
Portanto, questiona-se como seria possível que as atividades gerenciais de uma empresa – o que apenas é permitido aos servidores do âmbito federal que têm jornada reduzida de serviço – não tivessem influenciado na qualidade e até mesmo quantidade do serviço prestado pelo requerido?
A resposta é simples, não existe essa possibilidade, nobre julgador.
A partir do momento que se observa haver uma jornada estendida (entre 08:00 da manhã e 17:00 da tarde), qualquer outra atividade realizada ao mesmo tempo seria um empecilho ou ao menos uma distração para que a assessoria prestada pelo requerido fosse feita de forma correta.
Portanto, resta aqui evidenciado que a vedação do RJU para que servidores exerçam a gerência e administração de empresas enquanto vinculados ao Poder Público é inafastável, e tem como pano de fundo justamente garantir que o servidor se dedique ao trabalho público, evitando distrações ou mesmo favorecimentos pessoais por sua condição pessoal.
Não bastasse a violação legal acima mencionada, resta inequívoco o conhecimento da irregularidade da sua conduta, o que é atestado pela declaração que assinou conscientemente. Evidencia-se, portanto, a má-fé do requerido ao assinar uma declaração contendo informação falsa, com vistas a omitir que mantinha simultaneamente atividades incompatíveis com o exercício do cargo público para o qual foi nomeado, beneficiando-se indevidamente da iniciativa privada e da pública concomitantemente.
Nesse sentido, a jurisprudência rechaça condutas análogas às praticadas pelo requerido, senão vejamos:
MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. DEMISSÃO. NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. INEXISTÊNCIA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADES INCOMPATÍVEIS COM O CARGO E COM O HORÁRIO. APRESENTAÇÃO DE ATESTADOS MÉDICOS IRREGULARES AO ÓRGÃO PÚBLICO. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL EM INSTITUIÇÕES PRIVADAS DURANTE O PERÍODO DE LICENÇA MÉDICA. EXERCÍCIO DE GERÊNCIA DE EMPRESA. SUBSUNÇÃO DOS FATOS AOS DISPOSITIVOS QUE CONFIGURAM INFRAÇÕES PASSÍVEIS DE DEMISSÃO. 1. A penalidade de demissão decorreu da configuração das infrações indicadas, comprovadas nos autos do processo administrativo disciplinar, diante de todo o lastro probatório produzido pela comissão processante. 2. Tendo a penalidade decorrido da comprovação, nos autos do processo administrativo disciplinar, da infração administrativa perpetrada pelo servidor e constando do relatório da comissão processante que embasou a portaria demissória os motivos (fatos, provas e fundamentos) que justificaram a penalidade aplicada pela autoridade julgadora, não há falar em falta de motivação ou nulidade do processo administrativo. 3. Diante da comprovação da conduta prevista no art. 132, IV e XII, c/c o art. 117, X, da Lei n. 8.112/1990 (participar de gerência ou administração de sociedade privada ou exercer comércio, exceto como acionista, cotista ou comanditário), outra não poderia ser a penalidade aplicada, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade, motivo pelo qual não há falar em pena administrativa desproporcional. 4. É assente no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a infração disciplinar que configura ato de improbidade acarreta demissão, independentemente de ação judicial prévia, consequência direta da independência das esferas administrativa, civil e penal. (...) (STJ, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 23/10/2013, S3 - TERCEIRA SEÇÃO)

Vê-se, portanto, que o requerido incorreu em ato de improbidade administrativa previsto no art. 11, caput e inciso I, da Lei 8.429/92.

3.2.          DO IMPEDIMENTO DE EXERCÍCIO DA ADVOCACIA ENQUANTO NO EXERCÍCIO DE CARGO EM COMISSÃO NA ASSESSORIA DA ADMINISTRAÇÃO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DA PROIBIÇÃO LEGAL E INSTITUCIONAL.
Como visto alhures, além de exercer atividade de gerência em sociedade empresária que mantém em sociedade com a autoridade que o nomeou (Procurador Geral de Justiça) para o  cargo comissionado na Assessoria da Administração Superior do Ministério Público do Estado do Pará, o requerido exerce regularmente a advocacia, em manifesta incompatibilidade com o cargo por ele exercido, inclusive com incompatibilidade de horários.
A Lei Estadual nº. 5.810/94/94 (Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos do Estado do Pará) veda o exercício da advocacia aos servidores públicos
Art. 178 - É vedado ao servidor:
(...)
XXII - exercer a advocacia fora das atribuições institucionais, se ocupante do cargo incompatível;
(...)

O Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº. 8.906, de 4 de julho de 1994) igualmente prevê a incompatibilidade entre o exercício da advocacia e o exercício de funções públicas, consoante dispõem os artigos 28, inciso II e 34, inciso I, abaixo colacionados:
Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades: (...)
II - membros de órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas, dos juizados especiais, da justiça de paz, juízes classistas, bem como de todos os que exerçam função de julgamento em órgãos de deliberação coletiva da administração pública direta e indireta; (Vide ADIN 1127-8)

Art. 34. Constitui infração disciplinar:
I - exercer a profissão, quando impedido de fazê-lo, ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos, proibidos ou impedidos; (...)

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por sua vez, pronunciou-se sobre o tema, consoante enunciado abaixo transcrito:
Súmula 02/2009 do Órgão Especial do Conselho Federal da OAB (DJ 03.03.2010, P. 108): EXERCÍCIO DA ADVOCACIA POR SERVIDORES DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 28, INC. II, DO EAOAB. (...)”

Outro não poderia ser o entendimento do Conselho Nacional do Ministério Público, ao editar a Resolução nº 27, de 10 de março de 2008, que assim dispõe:
RESOLUÇÃO Nº 27, DE 10 DE MARÇO DE 2008. Disciplina a vedação do exercício da advocacia por parte dos servidores do Ministério Público dos Estados e da União.
O CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, no exercício das atribuições conferidas pelo artigo 130-A, §2º, inciso II, da Constituição da República, e no artigo 19 do seu Regimento interno, em conformidade com a decisão plenária proferida nos autos do processo n. 0.00.000.000126/2007-69, em sessão realizada no dia 18 de junho de 2007; Considerando os princípios constitucionais da moralidade, da isonomia e da eficiência; Considerando as disposições dos artigos 21 da Lei n. 11.415/2006 e 30 da Lei n. 8.906/94; Considerando a necessidade de estabelecer, no particular, tratamento isonômico entre os servidores do Ministério Público da União e dos Estados; RESOLVE:
Art. 1º. É vedado o exercício da advocacia aos servidores efetivos, comissionado, requisitados ou colocados à disposição do Ministério Público dos Estados e da União.
Art. 2º. Ficam resguardados os atos processuais já praticados, vedando-se, entretanto, a continuidade do exercício da advocacia, mesmo àqueles que já venham exercendo essa atividade até a data da publicação desta Resolução, observado o impedimento fixado no art. 30, I, da lei n. 8.906/94.
Art. 3º. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 10 de março de 2008.
ANTONIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA. Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público
Observa-se, então, que é mais do que patente a vedação para que os servidores públicos, efetivos ou comissionados, do Ministério Público exerçam concomitantemente com suas funções institucionais a advocacia. Além de a legislação vedar expressamente essa conduta, ambas as instituições – Ordem dos Advogados do Brasil e Ministério Público – são claras no sentido de não aceitar esta acumulação de funções, porquanto incompatíveis entre si.
Não bastasse a atuação do requerido como advogado, consoante documentos de fls. 146 a 180, 192 a 197 e 199, é bom que se diga que, pelas datas e horários dos peticionamentos e termos de audiência,  é possível verificar o exercício do patrocínio de André Ricardo Otoni Vieira em favor da autoridade que o nomeou, Marcos Antônio Ferreira das Neves, e  no horário em que deveria estar exercendo as funções do cargo comissionado para o qual foi nomeado.
Destacam-se, nesse ponto, as seguintes datas e horários dos petitórios constantes nos autos: 23/07/2013 às 14h57; 05/12/2013, às 10h24min (fls. 192 a 197), assim como pela certidão, às fls. 179, das oficialas de justiça que cumpriram mandado de desocupação do imóvel, que certificam a presença de André Ricardo Otoni Vieira no cumprimento da diligência em 27/01/2014.
Neste último caso, encontra-se demonstrado nos autos do Inquérito Civil que o requerido registrou seu ponto biométrico de entrada às 06:58 da manhã e o de saída às 17:09 (fls. 223).
Questiona-se, excelência, como seria possível que este indivíduo tenha registrado tamanha jornada de trabalho num dia em que às 09:00 da manhã estava realizando uma diligência advocatícia para o seu chefe e sócio em uma localidade tão distante (Rodovia Augusto Montenegro, km 05, localizada no entroncamento da cidade de Belém)?
E esta diligência dificilmente pode ser contestada, haja vista que quem a autuou, nos autos do processo de despejo 0054859-52.2012.8.14.0301 foram nada menos que três oficiais de justiça, servidores que gozam de fé pública em seus atos.
Na realidade, o que se vislumbra neste caso é que o demandado registrou o seu ponto e saiu para resolver assuntos alheios ao seu cargo comissionado. Burlou o regime de ponto eletrônico do Ministério Público, escarnecendo do controle efetivado em relação a todos os demais servidores.
Isto apenas leva a crer que tais condutas eram habituais, sobretudo quando se tem em conta as fichas de ponto acostadas aos autos (fls. 214 a 233 ), sendo em massiva maioria registradas com jornadas estendidas, começando às 08:00 da manhã e indo às vezes até muito depois das 17:00 da tarde.
Tendo em vista esta prova de que o requerido não estava no seu local de trabalho no horário registrado no ponto eletrônico neste dia específico, isto gera sérios indícios de que nos demais dias isto também ocorria, configurando uma habitualidade.
Considerando o exposto, vê-se que incontestavelmente o demandado incorreu em ato de improbidade administrativa, previsto no art. 11, caput e inciso I, da Lei nº 8.429/1992, in verbis:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;  
(destacamos).

Casos análogos em que condutas de agentes públicos se amoldam ao caso presente foram enquadrados como improbidade administrativa e sofreram as respectivas sanções legais, consoante julgados abaixo citados:

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Exercício da advocacia privada após a nomeação em cargo comissionado. Funções de assessoramento, chefia ou direção. Comprovação de litigância, inclusive contra os interesses da Administração Pública. Impossibilidade. Infringência do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa. Ofensa aos princípios da moralidade, legalidade e impessoalidade. Precedentes. Sentença mantida, neste aspecto. Exercício da advocacia privada após a nomeação em cargo comissionado. Funções de assessoramento, chefia ou direção. Comprovação de litigância, inclusive contra os interesses da Administração Pública. Perda da função pública. Cabimento. Inteligência do inc. III do art. 12 da Lei nº 9.492/92. Sentença mantida, neste aspecto. Exercício da advocacia privada após a nomeação em cargo comissionado. Reparação de danos. Inaplicabilidade, na espécie, pois não há provas de que tenha havido efetivo prejuízo econômico ao Município. Sentença reformada, neste aspecto. Exercício da advocacia privada após a nomeação em cargo comissionado. Multa. Cabimento. Danos incidentes no aspecto jurídico e moral. Aplicação do art. 12 da Lei nº 8.429/92. O sentido da aplicação da multa é desestimular a prática de condutas ilícitas, como as ocorridas nestes autos. Precedente. Sentença mantida, neste aspecto. Dosimetria da multa. Sanção imposta com razoabilidade. Reiteração de condutas ímprobas que justificam o valor fixado em sentença. Aplicação do inc. III do art. 12 da Lei de Improbidade. Precedente. Sentença mantida, neste aspecto. Recurso parcialmente provido. (TJ-SP - APL: 00018242420118260320 SP 0001824-24.2011.8.26.0320, Relator: Claudio Augusto Pedrassi, Data de Julgamento: 16/04/2013, 2ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 18/04/2013)
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. LITISPENDÊNCIA. CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA. PRESCRIÇÃO. CONDENAÇÃO DO REU ALÉM DO PEDIDO INICIAL. SERVIDOR OCUPANTE DO CARGO DE PROCURADOR FEDERAL. INCOMPATIBILIDADE DO EXERCÍCIO DE CARGO PÚBLICO CONCOMITANTE COM A ADVOCACIA PRIVADA. LEI 8.429/92, ART. 11. ATOS QUE ATENTAM CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...)  4- Na falta disciplinar punível com demissão diante da prática de ato ímprobo, qual seja, o exercício da advocacia privada incompatível com o cargo de Procurador Federal, o prazo prescricional é de cinco anos a contar da data do conhecimento do ato, o que restou cumprido. 5- A ação de improbidade administrativa se enquadra entre as denominadas ações coletivas, eis que se destina a tutelar os interesses metaindividuais de pessoas indeterminadas da sociedade, revelando-se hábil para proteger o patrimônio público, realçando o valor e a importância da probidade administrativa. Assim, trata-se de uma modalidade específica da ação civil pública em defesa da moralidade administrativa, aplicando-se, então, subsidiariamente, as regras da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública). 6- O exercício ilegal da advocacia privada praticada pelo Réu, concomitantemente ao exercício do cargo de Procurador Federal, durante cerca de 10 anos - no período de setembro de 1997 (vedação legal à advocacia privada) a maio de 2008 (aposentadoria) -, pode ser evidenciado a partir das informações prestadas pelo TRT da 17ª Região, pela Justiça Federal da SJ/ES e pela OAB/ES, bem como por meio das cópias das peças processuais acostados autos, conforme o Relatório Final, constando a descrição de alguns dos processos judiciais em que o Réu atuou como advogado privado. 7- Ao acumular por cerca de 10 anos cargo público de Procurador com o de advogado particular, de forma livre e desleal, privilegiou a advocacia em detrimento do serviço público, agindo em flagrante desafio ao órgão vinculado e denegrindo o nome de respeitada instituição, evidenciando a má-fé e o completo desrespeito pelo dever de probidade que deve reger a atuação de todo agente público, incidindo o art. 11, I da Lei 8.429/92. (...) Assim, considerando que a conduta ímproba atribuída ao Apelado encontra adequação no artigo 11 da Lei n. 8.429/92, enseja a condenação nos termos do art. 12, III, da mesma Lei. 9. Apelação parcialmente provida.  (TRF-2 - AC: 200950010061094  , Relator: Desembargador Federal GUILHERME DIEFENTHAELER, Data de Julgamento: 11/06/2013, QUINTA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: 05/07/2013)

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 8.429/1992. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO E DE INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL. REGIME DE DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. EXERCÍCIO DE OUTRA ATIVIDADE REMUNERADA (ADVOCACIA). ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADO. SANÇÕES. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. 1. As sanções civis decorrentes da prática de ato de improbidade administrativa, previstas na Lei 8.429/1992, podem se aplicadas de forma cumulativa com aquelas previstas na Lei nº 8112/90, eis que as penalidades civis, penais e administrativas são independentes entre si, conforme os arts. 121 e 125 da própria Lei nº 8112/90. 2. O procedimento administrativo e o inquérito civil público constituem meras faculdades, dispensáveis e prescindíveis na hipótese de o Ministério Público deter elementos probatórios de convicção da prática de ato de improbidade administrativa. A ação civil pública de improbidade administrativa não se subordina à prévia conclusão ou instauração de procedimento administrativo. 3. O professor universitário, em regime de dedicação exclusiva, está impedido de exercer outra atividade remunerada, pública ou privada (Lei 7.596/87 e Decreto 94.664/87, art. 14, II). 4. Restando incontroverso que o requerido exerceu a atividade privada remunerada (advocacia), além das atribuições de Professor Universitário da Universidade Federal de Uberlândia, não obstante a exigência de dedicação exclusiva, verifica-se a hipótese na prática de ato de improbidade, nos termos da Lei n. 8.429/92. 5. A Lei 8.429/92 prevê que as sanções, em ações de improbidade administrativa, podem ser aplicadas conjuntamente ou não, dependendo do caso. Por óbvio, o parágrafo único do art. 12 da Lei 8.429/92 diz que o juiz deverá levar em conta a extensão do dano causado e o proveito patrimonial obtido pelo agente. 6. Tendo o réu lecionado junto à Universidade Federal de Uberlândia, deve ser remunerado, ainda que não tenha atendido à cláusula de dedicação exclusiva, pois se trata de contraprestação do serviço prestado. Não há que se devolver o valor relativo à gratificação. 7. In casu, desproporcional impor ao réu as sanções pretendidas pelo agente ministerial (ressarcimento integral do dano e perda da função pública), sendo adequada e proporcional, sob o ângulo da prevenção e repressão, apenas a imposição de multa civil em favor da Universidade Federal de Uberlândia. (TRF-1 - AC: 9974 MG 0009974-31.2003.4.01.3803, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL TOURINHO NETO, Data de Julgamento: 03/09/2012, TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.372 de 14/09/2012)

Inequívoca, portanto, é a subsunção da conduta do Réu ao preceituado no art. 11, caput e inciso I, da Lei 8.429/92, o que atrai a incidência das sanções legais prescritas no art. 12, III, do mesmo diploma legal.

3.3.          DO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E SUAS REPERCUSSÕES
3.3.1.     Do Arcabouço Normativo
O combate aos atos de improbidade administrativa é de extrema relevância no ordenamento jurídico nacional e internacional, tanto que possui posição de destaque na Constituição Federal de 1988, consoante previsão do art. 37, §4º, que o incluiu no dispositico destinado aos princípios básicos que devem reger toda a atividade administrativa do Estado Brasileiro, para, em seguida, dispor sobre suas consequências e sobre a imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
§4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
§5º - A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.
Regulamentando a previsão constitucional, a Lei nº. 8.429/1992 passou a prever as hipóteses e as formas de combate aos atos de improbidade administrativa, onde são considerados como atos atentatórios à probidade administrativa os que importem em enriquecimento ilícito, prejuízos ao erário ou que atentem contra os princípios da administração pública.
Sobre a relevância do tema, o combate à improbidade administrativa transcende o ordenamento jurídico interno, para se tornar uma  preocupação mundial. A Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em seu art. 15, expressamente consigna que a sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua administração e, em seu art. 14, aduz ainda que todos os cidadãos têm o direito de verificar, por si ou por seus representantes, da necessidade da contribuição pública, de consenti-la livremente, de observar seu emprego e de lhe fixar a repartição, a coleta, a cobrança e a duração.
Continuando na evolução legislativa sobre o tema, o Brasil assumiu o compromisso internacional de combater os atos de corrupção, já que ratificou a Convenção sobre o Combate da Corrupção da OCDE, concluída em Paris, em 17 de dezembro de 1997, cuja recepção no ordenamento jurídico brasileiro se deu através do Decreto 3.678/2000.
O Brasil também recepcionou a Convenção Interamericana contra a Corrupção, adotada em Caracas, em 29 de março de 1996, promulgada através do Decreto 4.410/2002, que prevê que a corrupção solapa a legitimidade das instituições públicas e atenta contra a sociedade, a ordem moral e a justiça, bem como contra o desenvolvimento integral dos povos.
Igualmente, o Brasil é signatário da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, de 31 de outubro de 2003, tendo sua recepção sido formalizada através do Decreto n. 5.687/2006.
Recentemente, outra inovação se deu através da Lei 12.846/2013, que regulamenta a responsabilização civil e administrativa das pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, em que pese ainda não ter entrado em vigor, já vem sendo conhecida como “Lei Anticorrupção”.
Em que pese a constante evolução legislativa, a sociedade vem se mostrando impaciente e intolerante com a corrupção e a malversação dos recursos públicos, culturalmente disseminadas em todos os entes federativos, nos diferentes níveis hierárquicos e Poderes da República Brasileira, que, por isso, já é considerada institucionalizada.
Diante da falência ética de nossos poderes constituídos, os Tribunais vêm se mostrando igualmente atentos ao clamor social, através da constante evolução jurisprudencial sobre o tema.
Nessa mesma linha, pode-se citar a Meta 18 do Conselho Nacional de Justiça, que possui o escopo de agilizar o julgamento das ações de improbidade e a iniciativa do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, que, desde 2008, já reconhece a prioridade de tramitação das ações que envolvam litígios sobre direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, através do art. 1º, VIII, do Provimento 12/2008 – CMB.
Esse é um reflexo da vertente contemporânea do direito administrativo, que dispõe que entre o rol de direitos e garantias fundamentais dos cidadãos se encontra o direito fundamental à boa Administração Pública, extraído do art. 37 da CF.
Corroborando o entendimento de que a probidade na Administração Pública é um direito fundamental de toda a sociedade, em razão de seu caráter difuso, assim leciona Fernando Rodrigues Martins:
Muito embora patrimônio público moralidade administrativa se liguem de forma intensa, senão na integralidade, às manifestações do Estado, e, por conseguinte, restem avaliadas ante o cariz do interesse público, ao que parece, em termos de classificação, estariam mais voltadas a pertencer aos chamados direitos fundamentais de terceira geração, ou terceira dimensão, e, mais especialmente, “direitos de solidariedade”[3].
Diante de todo esse arcabouço jurídico, o Poder Judiciário tem o dever de proceder com severa reprimenda aos atos imorais de corrupção que importam em atos de improbidade administrativa.
Com efeito, conforme já demonstrado anteriormente, o requerido praticou atos de improbidade administrativa que importam em violação aos princípios da Administração Pública, previstos nos 11, caput  e inciso I, da Lei nº. 8.429/92, devendo receber as sanções cominadas no art. 12, inciso III, do mesmo diploma legislativo.
3.3.2.      Da Improbidade Administrativa Caracterizada e a Imputação De Sanções. Do dever de ressarcimento ao erário.
A Lei nº. 8.429/92 – Lei da Improbidade Administrativa –, editada para dar efetividade ao disposto no art. 37, § 4º, da Constituição Federal, dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências.
Merece destaque, para efeito desta ação, o artigo 2º da Lei nº 8.429/92, segundo o qual “Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior”.
O requerido ANDRÉ RICARDO OTONI VIEIRA era, ao tempo dos fatos (e voltou a ser muito recentemente) servidor público, uma das muitas subespécies do gênero “agente público”. Sobre a abrangência do gênero “agente público” ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2011, p. 526), “(...) é toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração Indireta (...)”.
Diante disso, no exercício do cargo de assessor do Procurador Geral de Justiça (MP.CPCP-102-6), o demandado pode sofrer as consequências da Lei de Improbidade Administrativa, de sorte que é de extrema relevância o regular processamento desta ação.
A conduta do requerido de assumir um cargo público na Administração Superior deste Órgão Ministerial e concomitantemente manter atividades privadas incompatíveis com o múnus público por ele assumido é ato de improbidade administrativa, que merece a correspondente sanção nos termos da legislação.
O requerido ao exercer atividades de gerência e administração de sociedade empresária, além do efetivo exercício da advocacia em concomitância com o exercício do cargo comissionado de assessor do Procurador Geral de Justiça, agravado por sua condição de sócio e amigo pessoal da autoridade pública que o nomeou, violou: o art. 178, VII e XXII, da Lei Estadual nº. 5.810/94/94 (Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos do Estado do Pará); os artigos 28, inciso II e 34, inciso I, ambos do  Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº. 8.906, de 4 de julho de 1994); a Súmula 02/2009 do Órgão Especial do Conselho Federal da OAB e a Resolução nº. 27, de 10 de março de 2008 do Conselho Nacional do Ministério Público. Resta, portanto, inequívoca a violação ao princípio da legalidade (ou da juridicidade, em uma acepção mais ampla).
Contrariar tais preceitos é ir de encontro com a idoneidade necessária ao cargo de assessoria jurídica da Administração Superior deste Ministério Público, configurando um ato ímprobo, enquadrando-se sem discussão nos termos do art. 11, caput e inciso I, da Lei nº. 8.429/92.
Ressalte-se, ademais, que quando do ingresso dos servidores para o cargo de “analista jurídico” nos quadros do Ministério Público (Edital 001/2012-MP), a própria OAB encaminhou um comunicado oficial para que o órgão instasse aqueles que não tinham ainda cancelado seus registros junto à autarquia OAB, o fizessem sob pena de responderem penalidades éticas e funcionais.
Então questiona-se: existe alguma fundamentação apta a gerar um tratamento diferenciado entre esses dois cargos?
Pensa-se que não, sobretudo porque suas atribuições são eminentemente iguais, a saber, análise jurídica e assessoria de Promotores e Procuradores de Justiça em suas atividades-fim.
Flagrante aí, novamente, a violação ao princípio da isonomia, em decorrência da condição pessoal de que desfruta o requerido, em detrimento de tantos outros servidores que foram obrigados a cancelarem seus registros nos quadros da OAB e encontram-se impedidos de advogar.
Desta forma, não há qualquer baliza legal ou infralegal que justifique o favorecimento do Sr André Ricardo Otoni Vieira, no sentido de que a ele fosse permitido advogar (e advogar para o seu chefe, destaque-se), e ainda se beneficiar dos bônus do serviço público.
Frise-se, ainda, que este servidor/sócio/advogado certamente não cobraria/não cobrou honorários advocatícios do chefe/sócio/cliente. Isto apenas evidencia a relação imoral entre os integrantes do serviço público e privados, justamente o que se tenta evitar ao estabelecerem-se severas regras de ingresso no serviço público e de condutas a serem observadas enquanto neste meio, garantindo-se a imparcialidade do serviço público.
Mesmo investido de cargo público comissionado, ele gozava das várias prerrogativas dos servidores efetivos, como remuneração fixa e certa, o que lhe permitia sobremaneira dedicar-se à advocacia com certa tranquilidade.
Desta forma, restou evidenciada a proibição de exercício da advocacia concomitante ao cargo público, de sorte que está visível o dolo do agente, permitindo ser punido nos rigores da lei de improbidade.
Beneficiou-se de sua condição pessoal de amigo e sócio para alcançar um cargo público. E isto contraria não apenas o princípio da moralidade, como também o da impessoalidade, este considerado na vertente de que os jurisdicionados não podem ser tratados de forma específica/pessoal em detrimento uns dos de outros.
É preciso se observar, na situação em tela, o que dispõe o art. 11, da lei 8.429/92:
Seção III
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administração Pública
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;
II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;
IV - negar publicidade aos atos oficiais;
V - frustrar a licitude de concurso público;
VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;
VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.
VIII - XVI a XXI - (Vide Lei nº 13.019, de 2014)  (Vigência) (grifo nosso)

É bastante claro que as condutas lá previstas são constantes de um rol meramente exemplificativo, sendo necessário amoldar-se os fatos à ratio do artigo e não meramente ao que lá está descrito.
E esta ratio diz respeito à proteção da Administração Pública contra atos tendentes a violar as bases principiológicas que lhe servem de suporte. As bases que lhe erigem como instituição forte e marco do Estado Democrático de Direito a orientar a conduta escorreita da sociedade.
No momento em que  um indivíduo usa de sua influência pessoal de sócio e amigo do PGJ  junto ao centro de poder para ingressar numa instituição como o Ministério Público estadual, o qual deveria pautar-se pela probidade, tem-se uma subversão da ordem pública.
E, neste ínterim, faz-se necessário frisar que a probidade e a moralidade são conceitos muito mais amplos que a simples legalidade.
Probidade, na linguagem comum, é sinônimo de honestidade, decência, retidão. O dever de probidade impõe ao agente público o desempenho de suas funções mediante atitudes retas, leais, justas e honestas, demonstrando integridade de caráter e lisura de conduta. Deve o administrador buscar sempre o melhor para a Administração, fazendo as opções acertadas e realizar os melhores negócios para o Erário, sob pena de tornar inválidos os seus atos.
No dizer de Hely Lopes Meirelles (2001, 257), "o dever de probidade está constitucionalmente integrado na conduta do administrador público como elemento necessário à legitimidade de seus atos.".
A moralidade, por sua vez, tem sentido mais amplo ainda e expressa o gênero do qual a probidade é espécie, pois o núcleo da probidade administrativa emana do princípio da moralidade administrativa, verdadeiro norte da administração, sendo as condutas contrárias à probidade lesivas à moralidade.
Assim, em outros termos, improbidade não é sinônimo de imoralidade, mas sim, uma espécie do gênero. A improbidade pressupõe a prática de atos que causem prejuízo ao erário e proveito ao agente. Seria uma espécie de imoralidade administrativa qualificada pelo dano ao erário.
A imoralidade é a ausência de princípios, de honestidade, e por isso toma proporções maiores do que a improbidade, que refere unicamente ao trato da coisa pública.
Neste diapasão, é importante frisar que a própria CRFB/88, quando dispõe sobre os princípios explícitos relativos à Administração Pública, a Constituição Federal também disponibilizou ferramentas para reprimir a sua inobservância, dentre as quais, a ação popular, importante arma contra os atos atentatórios à moralidade administrativa, podendo ser proposta por qualquer cidadão em gozo dos direitos políticos (artigo 5º, LXXIII).
Outrossim, o texto constitucional prevê também a imposição de sanções aos agentes públicos que praticarem atos de improbidade administrativa, quais sejam, a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, demonstrando a preocupação do legislador constituinte com o patrimônio público.
Em todo caso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica quanto à exigência do DOLO GENÉRICO para configuração do ato de improbidade previsto no art. 11, da lei 8.429/92. Neste sentido é o julgado abaixo:
STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 1285160 MG 2011/0233239-6 (STJ). Data de publicação: 12/06/2013. Ementa: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ATO DE IMPROBIDADE TIPIFICADO PELO ART. 11 DA LEI 8.429/92. PREFEITO MUNICIPAL. IRREGULARIDADES NO REPASSE DAS CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS AO INSTITUTO MUNICIPAL DE SEGURIDADE SOCIAL - IMSS. CONDUTA QUE ATENTA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 CPC NÃO OCORRENTE. DOLO GENÉRICO RECONHECIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REEXAME FÁTICO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. (...). 6. O Superior Tribunal de Justiça firmou orientação quanto à necessidade de ser comprovado o dolo genérico para a tipificação da conduta prevista no art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa . (...)”

O dolo é específico e manifesto ao se considerar a atuação do requerido como causídico, após sua nomeação para o cargo público de assessor do Procurador Geral de Justiça, o que é vedado pela legislação. Transcendendo à violação legal e, já adentrando na violação à moralidade e à impessoalidade, o requerido atuou como causídico em benefício da autoridade pública que o nomeou, ou seja, exerceu a advocacia na condição de procurador do próprio Procurador Geral de Justiça no processo de despejo nº. 0054859-52.2012.8.14.0301 e, ainda, nos dias e horários em que deveria estar no exercício de suas funções públicas.
  Não bastasse tudo isso, após as irregularidades ora demonstradas terem sido noticiadas ao Procurador Geral de Justiça em exercício, Dr. Manoel Santino, motivado por tais fatos, que foram comprovados, exonerou André Ricardo Otoni Vieira do cargo comissionado por ele exercido em 18/11/2014.
Contudo, repisando seu intento consciente e volitivo de violar os preceitos legais e principiológicos da Administração Pública, o requerido aceitou ser, novamente, nomeado por Marcos Antônio Ferreira das Neves (e, por óbvio, aceitou o cargo público) e voltou a exercer suas atividades como assessor do Procurador Geral de Justiça, mesmo permanecendo suas incompatibilidades para o exercício do cargo, como comprova o Diário Oficial de 10/12/2014, em anexo.
Por todo o exposto, requer-se a condenação do Demandado nas penas do art. 12, III, da lei 8.429/92, com especial friso para a perda do cargo, uma vez que ele foi readmitido no serviço público, no mesmo cargo e nos mesmos termos, a despeito de todas as irregularidades apontadas.
Inclui-se, aqui, o dever de ressarcimento ao erário, o qual decorre de previsão expressa da Constituição (art. 37, §§ 4º e 5º). Segundo a jurisprudência consolidada do STJ, uma vez caracterizado o prejuízo ao erário, o ressarcimento é obrigatório e não pode ser considerado propriamente uma sanção, mas consequência imediata e necessária do ato combatido.
Dessa forma, considerando que restou comprovado que o requerido exerceu atividades incompatíveis com o cargo público por ele exercido e em relação ao qual recebeu pagamento advindo do erário, além de exercer a advocacia em seu horário de trabalho, o ressarcimento ao erário é medida que se impõe na extensão do prejuízo causado, com os consectários legais (juros e atualização monetária), sem prejuízo de sofrer outras sanções previstas no artigo 12.
Assim, pleiteia-se a esse D. Juízo que proceda à reprimenda adequada e proporcional das sanções correspondentes à gravidade da conduta do demandado, levando-se em conta, sobretudo, o cargo por ele ocupado e a incompatibilidade de seus atos com a uma instituição de tamanho prestígio como o Ministério Público.

  1. DO PEDIDO CAUTELAR: DO NECESSÁRIO AFASTAMENTO PROVISÓRIO DO REQUERIDO DE SEU CARGO. DA INFLUÊNCIA NEGATIVA NA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. DA FLAGRANTE IMPROBIDADE. DA REPERCUSSÃO NEGATIVA PARA O MPE/PA E PARA TODA A SOCIEDADE.
Excelência, é preciso destacar o efeito negativo da permanência do demandado em suas atividades no Ministério Público do Estado do Pará, sendo necessário que se conceda cautelarmente seu afastamento cautelar do órgão.
Inicialmente, justifica-se a medida em virtude da provável influência na instrução probatória da demanda. E isto pôde ser verificado logo agora na instrução do Inquérito Civil.
Solicitados documentos relativos à atividade funcional do demandado ao RH (ficha funcional, folhas de ponto eletrônico e contracheques) e concedido o prazo de 10 (dez) dias para tanto, foi necessário reiterar o pedido sob as penas da lei para que tais documentos fossem finalmente entregues para as Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público, o que foi feito apenas no 11º dia do primeiro da primeira requisição.
E quando foram entregues tais documentos, observou-se serem facilmente produzidos pelo Departamento de Recursos Humanos: algumas folhas obtidas no registro eletrônico e plenamente acessíveis aos servidores que lá trabalham.
É notório, portanto, que não existe justificativa para um atraso tamanho para uma documentação facilmente alcançável e tão pequena.
Existem fundadas suspeitas de que isto se deve à atuação do próprio requerido, que tendo em vista sua relevante posição no MPE/PA (assessor da Procuradoria Geral de Justiça), tem a influência necessária para obstaculizar o acesso às provas relevantes para seu processamento.
É manifesto o interesse pessoal do requerido no exercício do cargo comissionado, para o qual recebe contraprestação advinda do erário, mas afasta-se da consecução pública para a qual foi nomeado, ao beneficiar a autoridade que o nomeou, ao exercer seu patrocínio no processo nº. 0054859-52.2012.8.14.0301, bem como em razão de ambos serem sócios de diversas sociedades empresariais e em uma delas, pelo menos, aquele figura como sócio administrador.
A permanência do demandado no cargo que ocupa compromete a apuração dos fatos por este Órgão Ministerial, assim como pelo Poder Judiciário, já que a matéria está sendo judicializada.
Desta feita, invocando o PODER GERAL DE CAUTELA (art. 798 do CPC[4]),  requer-se o afastamento cautelar do requerido do cargo que exerce, pretendendo a GARANTIA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
A necessidade de afastamento cautelar do cargo está prevista no art. 20, parágrafo único, da Lei 8.429/1992, de seguinte teor:
Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual. (Grifou-se)

De acordo com a jurisprudência pátria, a referida medida cautelar é cabível quando houver prova bastante de que o agente público praticou o ato de improbidade e esteja apto a dificultar as investigações, consoante julgados abaixo colacionados:
PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE LIMINAR. A norma do art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429, de 1992, que prevê o afastamento cautelar do agente público durante a apuração dos atos de improbidade administrativa, só pode ser aplicada em situação excepcional, quando, mediante fatos incontroversos, existir prova suficiente de que esteja dificultando a instrução processual. Agravo regimental não provido. (STJ, Corte Especial, AgRg na SLS.867/CE, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, publicado no DJ em 24/11/2008).

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇAO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – AFASTAMENTO CAUTELAR DE TITULAR DE MANDATO ELETIVO - LEGALIDADE. 1. A medida de afastamento cautelar da função pública pode ser aplicada, também, aos agentes políticos, nos termos do art. 20, parag. único, da Lei Federal nº. 8.429/92. O exercício de cargo público, inclusive o decorrente de representação popular, pressupõe procedimento compatível com vários princípios éticos e constitucionais, dentre os quais se avulta o (princípio) da moralidade. (TJ/ES, Agravo de Instrumento 24089006902, Relator: ANNIBAL DE REZENDE LIMA, Data de Julgamento: 16/09/2008, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/12/2008)

In casu, analisando os documentos acostado aos autos, é inequívoco o enquadramento da conduta do requerido como ato de improbidade administrativa e manifesta a violação aos princípios da impessoalidade, moralidade e legalidade.
Tendo em vista a flagrante situação de improbidade administrativa, como está amplamente descrito nesta peça processual, sem olvidar a repercussão negativa para a instituição do MPE/PA, a medida de afastamento se faz da mais alta monta para que seja preservado o desenrolar processual de forma hígida e regular.
Manter o Sr. André Ricardo Otoni Vieira no exercício da função pública para o qual foi irregularmente nomeado seria permitir que se mantivesse uma irregularidade, ao arrepio da lei.
Não é demais consignar que tais provimentos cautelares são reversíveis, haja vista a índole provisória das medidas, de sorte a permitir eventual retorno ao 'status quo ante'. Dessa forma, o deferimento dos pleitos acautelatórios aqui requeridos não encontra nenhum óbice na legislação, doutrina e jurisprudência.
Com o fim de influir no livre convencimento de V. Exa, ressalta-se, oportunamente, que nessa fase preliminar da ação de improbidade administrativa vigora o princípio do in dubio pro societate. Ou seja, havendo indícios suficientes (o que se reputa obtido das provas já apresentadas no processo), é necessário que se tutele o bem da sociedade, bem como a moralidade e a probidade administrativa.

  1. DOS PEDIDOS:
Em face do que foi exposto e demonstrado, o Ministério Público do Estado do Pará requer:
1.     A Distribuição Por Dependência ao processo 0064529-46.2014.8.14.0301, em trâmite na 4ª Vara de Fazenda de Belém;

2.     A Prioridade De Tramitação, em consonância com o disposto no art. 1º, VIII, do Provimento n. 12/2008, da Corregedoria da Região Metropolitana de Belém do E. TJPA;

3.     O deferimento do Pedido Cautelar inaudita altera pars de afastamento provisório do Sr. André Ricardo Otoni Vieira, requerido nesta demanda, por ser medida necessária para a regular instrução deste feito;

4.     A Notificação do requerido para, querendo, oferecer manifestação por escrito, no prazo de 15 dias, na forma como estabelece o art. 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92;

5.     A Notificação do Estado do Pará, através de sua Procuradoria-Geral localizada na Rua dos Tamoios, 1671, CEP: 66.025-540 - Batista Campos, Belém/PA, para, querendo, integrar a lide;

6.     Após a notificação acima mencionada, e com manifestação prévia nos autos ou decorrendo in albis o prazo concedido para tanto, requer o Recebimento Da Inicial, determinando-se a Citação do requerido para, querendo, contestar a ação, no prazo legal, sob pena de confissão quanto à matéria de fato e sob os efeitos da revelia;

7.     A Procedência dos pedidos contidos nesta exordial, com a condenação do demandado nas sanções previstas no artigo 12, inciso IIII, da Lei nº 8.429/92, no que couber, diante da clara violação dos princípios regentes da Administração Pública, cujas sanções são: ressarcimento integral do dano, acrescido dos consectários legais (juros e atualização monetária), perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;

8.     A condenação do requerido ao ressarcimento ao erário, na medida da lesão causada por sua ausência no serviço, em virtude da prática de outras atividades incompatíveis com sua condição de servidor público;

9.     A condenação do requerido ao pagamento das custas e demais despesas processuais, arcando com o ônus da sucumbência;

10.  A produção de todos os meios de prova admitidos em Direito; e com especial destaque para a produção probatória relativa ao depoimento do demandado e prova documental, pericial e testemunhal dos agentes responsáveis pelo departamento de Recursos Humanos do Ministério Público e assessores atuantes junto à PGJ,
Dá-se à causa o valor de R$ 327.161,01 (trezentos e vinte e sete mil, cento e sessenta e um reais e um centavo)[5].
São os termos em que pede deferimento
Belém, 16 de dezembro de 2014.

HELENA MARIA OLIVEIRA MUNIZ GOMES
2ª Promotora de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa,
em exercício cumulativo no 1º cargo


DOMINGOS SÁVIO ALVES DE CAMPOS
3º Promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa





FIRMINO ARAÚJO DE MATOS
4º Promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa

ELAINE CASTELO BRANCO
5ª Promotora de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa, em exercício cumulativo no 6º cargo



[1] Art. 76 do Código Civil. Art. 76. Têm domicílio necessário o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso. Parágrafo único. O domicílio do incapaz é o do seu representante ou assistente; o do servidor público, o lugar em que exercer permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso, o lugar em que cumprir a sentença.
[2]Licença do cargo de Procurador Geral de Justiça para participar do processo eleitoral com a pretensão de ser reconduzido ao mesmo cargo.
[3] MARTINS, Fernando Rodrigues. Controle do Patrimônio Público. RT, 3ª ed., p. 62
[4] Art. 798. Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.
[5] Valor da causa obtido partir do cálculo da soma da remuneração do servidor demandado pelo período de 01 (um) ano e 07 (sete) meses em que esteve investido no cargo comissionado para o qual foi admitido no MP, veiculado nos contracheques fornecidos pelo Departamento de Recursos Humanos do Ministério Público do Estado do Pará.

4 comentários :

Anônimo disse...

Pai misericordioso... se tudo que tiver escrito ai for verdade é um escândalo nível nacional!

Anônimo disse...

Tinha certeza que os Promotores de Justiça da Improbidade não iriam decepcionar. Parabéns Dra. Helena Muniz (guerreira, ousada, corajosa, justa, independente) Dr. Firmino ( Serio, honesto, probo), Dr. Sávio (determinado, firme, justo) e Dra. Elaine Castelo Branco ( justa, honesta). Voces estao de parabens , acao perfeita! Com a palavra o TJE. A população paraense aguarda uma resposta.

Anônimo disse...

Se comprovaram que embora estivesse cumprindo diligencia para o chefe/sócio/cliente e que o ponto eletrônico apontava que no mesmo dia e horário o assessor estava trabalhando no MP, não vão apurar a responsabilidade por tamanha divergência? Não vão apurar o chefe imediato que atestou a frequência dele naquele dia da diligencia na Augusto Montenegro? Isso é fraude e, como tal, deve ser apurada e os responsáveis (por ação ou omissão) punidos.

Anônimo disse...


Além das sanções administrativas e civis que o superprotegido ANDRÉ RICARDO OTONI VIEIRA, afilhado do Procurador Geral de Justiça, pode vir sofrer, ele eve sofrer sanção de cunho penal, isto porque suas declarações falsas constituem crime de FALSIDADE IDEOLÓGICA.

Vejamos o enunciado do crime de FALSIDADE IDEOLÓGICA disposto no Código Penal Brasileiro (CPB):

"Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

Pena - reclusão, de UM (1) a CINCO (5) ANOS, e multa, se o documento é público, e reclusão de UM (1) a TRÊS (3) ANOS, e multa, se o documento é particular".

Portanto, além da AÇÃO CIVIL, cabe a respectiva AÇÃO PENAL, sem necessidade de Inquérito Policial, pois a prova existente é suficiente para a promoção da competente DENÚNCIA.

O que falta então, para que os promotores também façam a DENÚNCIA do crime?