domingo, 24 de agosto de 2014

GETÚLIO – Da vida para a história

Getúlio Vargas, o Pai dos Pobres: de ditador a presidente eleito.

        “Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história.”
        O que ele próprio previu no arremate da sua carta-testamento, que é o mais célebre texto atribuído a um presidente do Brasil, acabou por ocorrer e tornou Getúlio Vargas um personagem definitivamente incorporado à história sob a aura destinada aos heróis das massas. Mesmo 60 anos depois de seu suicídio, ocorrido às 8 horas da manhã de 24 de agosto de 1954, com um tiro no coração, na esteira de uma das mais dramáticas crises político-militar do País, Getúlio Vargas perdura como uma referência obrigatória, para o bem ou para o mal, sempre que se trata de algumas das mais vitais transformações pelas quais passou o Brasil. O suicídio, pela comoção que provocou, acabou por fazer sobrepor, para as massas, a figura do presidente eleito, que governou de 1951 a 1954, ao ditador que também foi Getúlio, ao comandar com mãos de ferro, e alta dose de intolerância e truculência, o Estado Novo, de 1930 a 1945, até ser deposto pelos militares.
        De ditador a presidente eleito, Getúlio percorreu um tortuoso caminho. O Pai dos Pobres, que patrocinou a legislação trabalhista, com uma série de conquistas para os assalariados - como a instituição da Carteira Profissional, do salário mínimo e da jornada de trabalho de oito horas diárias, dentre outros benefícios -, foi o mesmo que namorou o nazifascismo, reprimiu violentamente a oposição e ignominiosamente deportou Olga Benário, mesmo grávida, para a Alemanha, onde a mulher do líder comunista Luiz Carlos Prestes, preso juntamente com ela no Brasil, seria remetida a um campo de concentração e assassinada pelos nazistas. As condições sob as quais Getúlio manteve Prestes na prisão eram tão abjetas que o advogado do líder comunista, o respeitável Sobral Pinto, invocou a Lei de Proteção aos Animais, em defesa do seu cliente, a quem defendeu gratuitamente, ainda que dele discordando visceralmente do ponto de vista político. Deposto, o Pai dos Pobres retornou ao poder aclamado pelo povo, como presidente eleito, protagonizando um governo tumultuado, fustigado impiedosamente pela oposição implacável dos setores conservadores da sociedade brasileira.

        A carta-testamento, com o valor que também tem como peça literária, reforçou a comoção causada pelo suicídio de Getúlio, revertendo completamente o clima que precedeu o desfecho da tragédia. Nos 15 dias anteriores ao seu suicídio, ele foi impiedosamente criticado pela imprensa. A população, forças políticas e as Forças Armadas exigiam sua renúncia. O que certamente explica a passagem do documento na qual Getúlio denuncia o linchamento político do qual era vítima. “Mais uma vez as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam; e não me dão o direito de defesa”, desabafa, na sua despedida.

Nenhum comentário :